domingo, 18 de julho de 2010
O HOMEM EVOLUIU COMO UM ANIMAL CARNIVORO OU VEGETARIANO?
O HOMEM EVOLUIU COMO UM ANIMAL CARNIVORO OU VEGETARIANO?
Sérgio Greif
Junho de 2010
É comum, atualmente, que no debate entre consumidores de carne e vegetarianos sejam utilizados argumentos relacionados aos "homens das cavernas", uns argumentando que os homens evoluíram como carnívoros e outros argumentando que evoluíram como vegetarianos. O presente texto traz considerações com relação a esse assunto. Conforme a teoria evolutiva corrente, por volta de 6 e 7 milhões de anos atrás viveu nas florestas africanas um antepassado do homem do tamanho de um chimpanzé, denominado Orrorin tugenensis. Esse proto-homem passava a maior parte do tempo nas árvores, em busca de seu alimento (frutas e folhas), mas as vezes descia ao solo. A presença de grandes molares e de pequenos caninos sugere que esses hominídeos tinham uma dieta baseada em vegetais, mas podemos inferir que, eventualmente, insetos e pequenos vertebrados também fizessem parte de sua dieta, à semelhança do que ocorre entre os chimpanzés.
Por volta de 4 milhões de anos atrás, o aquecimento global (que já existia nessa época) reduziu grande parte das florestas africanas a savanas, e isso levou os antepassados do homem a buscar novas adaptações. O espaçamento entre as árvores e a necessidade de percorrer grandes distâncias para encontrar seu alimento levou a um maior desenvolvimento do bipedalismo (capacidade de andar em duas pernas). Surgia então o gênero Australopithecus, com representantes com pouco mais de 1 metro de altura, cérebro pequeno e rosto largo, cujos representantes mais conhecidos foram o A. afarensis e o A. africanus.
Devido às condições de seu ambiente e às suas limitações físicas, esses hominídeos encontravam grande dificuldade em encontrar boas condições para sua subsistência. As frutas já não eram tão abundantes como na floresta, e o capim, que agora abundava nas savanas, não era digerível. Também para obter outros tipos de alimentos eles tinham grande dificuldade, visto que esses hominídeos não eram bem adaptados à caça. Eles não eram rápidos o suficiente para alcançar uma gazela na corrida, nem tinham garras, presas ou força suficiente para abatê-las.
Por isso, a maior parte do tempo, esses hominídeos passava forrageando, se deslocando em busca de folhas, raízes e frutos que conseguisse digerir. Eventualmente, quando encontrava um animal doente ou já morto ele consumia a carne com voracidade, pois carne significava uma grande quantidade de calorias e nutrientes concentrados, em um mundo onde não se sabia quando seria a próxima refeição.
Onivoria, quando não se tem controle sobre o meio ambiente, é uma vantagem evolutiva, porque permite que se coma qualquer coisa e não se morra de fome.
Por volta de 2 milhões de anos atrás, a competição por recursos nas savanas africanas havia aumentado bastante. As florestas eram ainda menos abundantes e nas savanas proliferava uma fauna de grandes herbívoros pastadores; os grandes predadores eram mais eficientes no abate de presas e mesmo as carcaças por eles abandonadas precisavam ser disputadas com hienas e abutres.
O homem precisou então criar novas estratégias evolutivas: Ele precisaria se tornar tão bom pastador quanto os outros pastadores ou tão bom predador quanto os outros predadores. Ou seja, precisava se tornar competitivo.
O caminho adotado foi o da 'irradiação', da 'diversificação adaptativa'. Nesse período surgiram várias espécies de hominídeos, das quais conhecemos pelo menos 5 espécies. Um grupo de hominídeos, o gênero Paranthropus, optou por se especializar na alimentação à base de vegetais fibrosos e pouco nutritivos, por isso desenvolveu um corpo robusto, com mandíbulas pesadas, molares bem achatados e um trato digestivo que permitia o consumo de grande quantidade de alimentos. Essas adaptações permitiam que esse hominídeo processasse alimentos como o capim e as cascas de árvores. É provável que esses hominídeos fossem estritamente vegetarianos, o que não demandava a fabricação de instrumentos ou a elaboração de estratégias de caça. O Paranthropus tinha o corpo robusto, mas o cérebro era pequeno, e o ambiente era extremamente favorável ao seu estilo de vida.
Por essa mesma época surgiam nas savanas outros grupos de homens, hoje reconhecidos como a transição entre os Australopithecus e o que já reconhecemos como os primeiros homens pertencentes ao gênero Homo. Eles eram a princípio necrófagos que seguiam os grandes predadores em busca das carcaças abandonadas, mas com o tempo desenvolveram técnicas para abater suas próprias presas. Esse gênero, que não podia digerir capim e cascas de árvore, especializou-se na caça de animais, consumindo também, sempre que disponível, vegetais mais nutritivos. Suas principais adaptações foram o desenvolvimento de ferramentas de pedra cada vez mais elaboradas, de um sistema de comunicação mais articulado e, um milhão de anos após, no domínio do fogo.
Esses hominídeos, para desenvolverem sua capacidade de cognição (crescimento do cérebro) precisaram tirar a energia de outros órgãos. Considerando que a maior parte da energia corpórea era gasta para manter o trato digestivo e que o tipo de alimentação adotado se consistia em sua maior parte de alimentos calóricos com nutrientes concentrados, os intestinos desse homem diminuiu, à medida que seu cérebro aumentava.
Nesse período em que os dois gêneros (os Paranthropus vegetarianos e a os Homo onívoros) coexistiram, o vegetarianismo, ou herbivoria, apresentou-se como uma vantagem. Pode-se imaginar que o Paranthropus levasse uma vida tranqüila, vivendo em vales verdes abundantes em seus alimentos, sem se arriscar em caçadas ou competir com outros predadores; As espécies do gênero Homo, por outro lado, encontravam-se sempre no limiar da sobrevivência, quase minguando de fome, arriscando-se em caçadas e precisando deslocar-se por grandes extensões de terra para encontrar seu alimento.
Novas mudanças climáticas posteriores diminuíram as extensões dos pastos, e as áreas verdejantes, em sua grande parte, deixaram de existir. Os Paranthropus definharam. O gênero Homo, mais acostumado aos deslocamentos sucessivos e à falta de segurança alimentar sobreviveu. Somos descendentes desses homens.
Ao contrário do que se acredita, a paleoantropologia não defende uma sucessão linear, onde o Homo habilis tenha dado origem ao Homo rudolfensis e ao Homo ergaster, e que desse tenha surgido o Homo erectus, o Homo heidelbergensis que deu origem ao Homo neardentalis e ao Homo sapiens, espécie à qual pertencemos. A evolução de todas essas espécies aconteceu a partir de ancestrais comuns, muitos deles ainda não encontrados.
Importante é que entendamos que as condições em que a evolução humana se deu permitiram que o homem desenvolvesse sua inteligência para compensar seus desvantajosos atributos físicos. Pedras lascadas para compensar a falta de garras e presas, lanças para compensar a pouca velocidade, estratégias de emboscada para compensar a falta de resistência. A carne nos acompanhou grande parte desse tempo, seja da carcaça abatida por outros animais, seja por nossos próprios ancestrais, mas não porque seus nutrientes fossem essenciais. A carne era muitas vezes a única opção.
O fato de que descendemos de Australopithecus e Homos carnívoros não nos torna carnívoros, nem aponta para o que deva ser nossa alimentação natural, alimentação para a qual fomos desenhados. Se em determinado momento de nossa evolução era determinante que a carne fizesse parte da alimentação, o atual momento aponta exatamente para o contrário.
Novas etapas de desenvolvimento levaram ao domínio da agricultura e então o homem começou a selecionar plantas com melhor composição de nutrientes e de melhor digestibilidade. Se a onivoria é uma vantagem evolutiva quando não se tem controle sobre o meio ambiente, a opção por uma alimentação em níveis mais baixos na cadeia alimentar passa a ser vantagem quando esse controle é conquistado. O homem agricultor tinha a segurança de saber que, se cuidasse de sua plantação, teria alimento para o ano inteiro. O cultivo de vegetais também permitia o sustento da família sem a necessidade de grandes deslocamentos. Permitia a fixação à terra e o sustento de um núcleo populacional maior em menor área. Mas mesmo isso não tornou o homem um animal vegetariano. O agricultor eventualmente empreendia caçadas nas florestas próximas, sendo a carne consumida sempre que encontrada.
A criação de animais (desenvolvida mais ou menos na mesma época em que se iniciou a agricultura) concentrou-se nas terras menos propícias ao cultivo. As populações humanas que se especializaram na criação de animais eram geralmente nômades e precisavam estar em constantes deslocamentos, em busca de novos pastos. Por isso não podiam subsistir com grande número de indivíduos. As populações que optaram pela agricultura fixaram-se à terra, podiam concentrar maior número de indivíduos e baseavam sua alimentação nos vegetais, não sendo porém vegetarianos.
Podemos dizer que a maior parte de sua história, as populações humanas subsistiram com dietas à base de vegetais, com o eventual acréscimo de.algum componente de origem animal. Essa ainda é a alimentação predominante dos seres humanos nos dias de hoje, quando consideramos que a maior parte dos seres humanos não tem acesso a produtos de origem animal. Esse "quase-vegetarianismo-involuntário", no entanto, não prova que o homem seja um animal vegetariano por natureza, e nem que, por outro lado, a desnutrição dessas populações possa ser atribuída a uma inferioridade da alimentação à base de vegetais.
Se a carnivoria foi determinante para a sobrevivência do homem em determinadas etapas de sua evolução, hoje ela se apresenta como uma desvantagem evolutiva (a carne está associada à maior incidência de doenças e a ocupação menos sustentável da terra). Também os vegetarianos não devem buscar na evolução do homem elementos para defender seu ponto de vista, o vegetarianismo é perfeitamente defensável sem a necessidade de uso dessa retórica.
Sérgio Greif
Junho de 2010
É comum, atualmente, que no debate entre consumidores de carne e vegetarianos sejam utilizados argumentos relacionados aos "homens das cavernas", uns argumentando que os homens evoluíram como carnívoros e outros argumentando que evoluíram como vegetarianos. O presente texto traz considerações com relação a esse assunto. Conforme a teoria evolutiva corrente, por volta de 6 e 7 milhões de anos atrás viveu nas florestas africanas um antepassado do homem do tamanho de um chimpanzé, denominado Orrorin tugenensis. Esse proto-homem passava a maior parte do tempo nas árvores, em busca de seu alimento (frutas e folhas), mas as vezes descia ao solo. A presença de grandes molares e de pequenos caninos sugere que esses hominídeos tinham uma dieta baseada em vegetais, mas podemos inferir que, eventualmente, insetos e pequenos vertebrados também fizessem parte de sua dieta, à semelhança do que ocorre entre os chimpanzés.
Por volta de 4 milhões de anos atrás, o aquecimento global (que já existia nessa época) reduziu grande parte das florestas africanas a savanas, e isso levou os antepassados do homem a buscar novas adaptações. O espaçamento entre as árvores e a necessidade de percorrer grandes distâncias para encontrar seu alimento levou a um maior desenvolvimento do bipedalismo (capacidade de andar em duas pernas). Surgia então o gênero Australopithecus, com representantes com pouco mais de 1 metro de altura, cérebro pequeno e rosto largo, cujos representantes mais conhecidos foram o A. afarensis e o A. africanus.
Devido às condições de seu ambiente e às suas limitações físicas, esses hominídeos encontravam grande dificuldade em encontrar boas condições para sua subsistência. As frutas já não eram tão abundantes como na floresta, e o capim, que agora abundava nas savanas, não era digerível. Também para obter outros tipos de alimentos eles tinham grande dificuldade, visto que esses hominídeos não eram bem adaptados à caça. Eles não eram rápidos o suficiente para alcançar uma gazela na corrida, nem tinham garras, presas ou força suficiente para abatê-las.
Por isso, a maior parte do tempo, esses hominídeos passava forrageando, se deslocando em busca de folhas, raízes e frutos que conseguisse digerir. Eventualmente, quando encontrava um animal doente ou já morto ele consumia a carne com voracidade, pois carne significava uma grande quantidade de calorias e nutrientes concentrados, em um mundo onde não se sabia quando seria a próxima refeição.
Onivoria, quando não se tem controle sobre o meio ambiente, é uma vantagem evolutiva, porque permite que se coma qualquer coisa e não se morra de fome.
Por volta de 2 milhões de anos atrás, a competição por recursos nas savanas africanas havia aumentado bastante. As florestas eram ainda menos abundantes e nas savanas proliferava uma fauna de grandes herbívoros pastadores; os grandes predadores eram mais eficientes no abate de presas e mesmo as carcaças por eles abandonadas precisavam ser disputadas com hienas e abutres.
O homem precisou então criar novas estratégias evolutivas: Ele precisaria se tornar tão bom pastador quanto os outros pastadores ou tão bom predador quanto os outros predadores. Ou seja, precisava se tornar competitivo.
O caminho adotado foi o da 'irradiação', da 'diversificação adaptativa'. Nesse período surgiram várias espécies de hominídeos, das quais conhecemos pelo menos 5 espécies. Um grupo de hominídeos, o gênero Paranthropus, optou por se especializar na alimentação à base de vegetais fibrosos e pouco nutritivos, por isso desenvolveu um corpo robusto, com mandíbulas pesadas, molares bem achatados e um trato digestivo que permitia o consumo de grande quantidade de alimentos. Essas adaptações permitiam que esse hominídeo processasse alimentos como o capim e as cascas de árvores. É provável que esses hominídeos fossem estritamente vegetarianos, o que não demandava a fabricação de instrumentos ou a elaboração de estratégias de caça. O Paranthropus tinha o corpo robusto, mas o cérebro era pequeno, e o ambiente era extremamente favorável ao seu estilo de vida.
Por essa mesma época surgiam nas savanas outros grupos de homens, hoje reconhecidos como a transição entre os Australopithecus e o que já reconhecemos como os primeiros homens pertencentes ao gênero Homo. Eles eram a princípio necrófagos que seguiam os grandes predadores em busca das carcaças abandonadas, mas com o tempo desenvolveram técnicas para abater suas próprias presas. Esse gênero, que não podia digerir capim e cascas de árvore, especializou-se na caça de animais, consumindo também, sempre que disponível, vegetais mais nutritivos. Suas principais adaptações foram o desenvolvimento de ferramentas de pedra cada vez mais elaboradas, de um sistema de comunicação mais articulado e, um milhão de anos após, no domínio do fogo.
Esses hominídeos, para desenvolverem sua capacidade de cognição (crescimento do cérebro) precisaram tirar a energia de outros órgãos. Considerando que a maior parte da energia corpórea era gasta para manter o trato digestivo e que o tipo de alimentação adotado se consistia em sua maior parte de alimentos calóricos com nutrientes concentrados, os intestinos desse homem diminuiu, à medida que seu cérebro aumentava.
Nesse período em que os dois gêneros (os Paranthropus vegetarianos e a os Homo onívoros) coexistiram, o vegetarianismo, ou herbivoria, apresentou-se como uma vantagem. Pode-se imaginar que o Paranthropus levasse uma vida tranqüila, vivendo em vales verdes abundantes em seus alimentos, sem se arriscar em caçadas ou competir com outros predadores; As espécies do gênero Homo, por outro lado, encontravam-se sempre no limiar da sobrevivência, quase minguando de fome, arriscando-se em caçadas e precisando deslocar-se por grandes extensões de terra para encontrar seu alimento.
Novas mudanças climáticas posteriores diminuíram as extensões dos pastos, e as áreas verdejantes, em sua grande parte, deixaram de existir. Os Paranthropus definharam. O gênero Homo, mais acostumado aos deslocamentos sucessivos e à falta de segurança alimentar sobreviveu. Somos descendentes desses homens.
Ao contrário do que se acredita, a paleoantropologia não defende uma sucessão linear, onde o Homo habilis tenha dado origem ao Homo rudolfensis e ao Homo ergaster, e que desse tenha surgido o Homo erectus, o Homo heidelbergensis que deu origem ao Homo neardentalis e ao Homo sapiens, espécie à qual pertencemos. A evolução de todas essas espécies aconteceu a partir de ancestrais comuns, muitos deles ainda não encontrados.
Importante é que entendamos que as condições em que a evolução humana se deu permitiram que o homem desenvolvesse sua inteligência para compensar seus desvantajosos atributos físicos. Pedras lascadas para compensar a falta de garras e presas, lanças para compensar a pouca velocidade, estratégias de emboscada para compensar a falta de resistência. A carne nos acompanhou grande parte desse tempo, seja da carcaça abatida por outros animais, seja por nossos próprios ancestrais, mas não porque seus nutrientes fossem essenciais. A carne era muitas vezes a única opção.
O fato de que descendemos de Australopithecus e Homos carnívoros não nos torna carnívoros, nem aponta para o que deva ser nossa alimentação natural, alimentação para a qual fomos desenhados. Se em determinado momento de nossa evolução era determinante que a carne fizesse parte da alimentação, o atual momento aponta exatamente para o contrário.
Novas etapas de desenvolvimento levaram ao domínio da agricultura e então o homem começou a selecionar plantas com melhor composição de nutrientes e de melhor digestibilidade. Se a onivoria é uma vantagem evolutiva quando não se tem controle sobre o meio ambiente, a opção por uma alimentação em níveis mais baixos na cadeia alimentar passa a ser vantagem quando esse controle é conquistado. O homem agricultor tinha a segurança de saber que, se cuidasse de sua plantação, teria alimento para o ano inteiro. O cultivo de vegetais também permitia o sustento da família sem a necessidade de grandes deslocamentos. Permitia a fixação à terra e o sustento de um núcleo populacional maior em menor área. Mas mesmo isso não tornou o homem um animal vegetariano. O agricultor eventualmente empreendia caçadas nas florestas próximas, sendo a carne consumida sempre que encontrada.
A criação de animais (desenvolvida mais ou menos na mesma época em que se iniciou a agricultura) concentrou-se nas terras menos propícias ao cultivo. As populações humanas que se especializaram na criação de animais eram geralmente nômades e precisavam estar em constantes deslocamentos, em busca de novos pastos. Por isso não podiam subsistir com grande número de indivíduos. As populações que optaram pela agricultura fixaram-se à terra, podiam concentrar maior número de indivíduos e baseavam sua alimentação nos vegetais, não sendo porém vegetarianos.
Podemos dizer que a maior parte de sua história, as populações humanas subsistiram com dietas à base de vegetais, com o eventual acréscimo de.algum componente de origem animal. Essa ainda é a alimentação predominante dos seres humanos nos dias de hoje, quando consideramos que a maior parte dos seres humanos não tem acesso a produtos de origem animal. Esse "quase-vegetarianismo-involuntário", no entanto, não prova que o homem seja um animal vegetariano por natureza, e nem que, por outro lado, a desnutrição dessas populações possa ser atribuída a uma inferioridade da alimentação à base de vegetais.
Se a carnivoria foi determinante para a sobrevivência do homem em determinadas etapas de sua evolução, hoje ela se apresenta como uma desvantagem evolutiva (a carne está associada à maior incidência de doenças e a ocupação menos sustentável da terra). Também os vegetarianos não devem buscar na evolução do homem elementos para defender seu ponto de vista, o vegetarianismo é perfeitamente defensável sem a necessidade de uso dessa retórica.
Do sangue, da assepsia, e da construção simbólica em torno da mercadoria-carne
Do sangue, da assepsia, e da construção simbólica em torno da mercadoria-carne
Giulia Bauab Levai
Também disponível em http://migre.me/MZa1
O presente artigo surgiu na necessidade de se fazer um trabalho final em uma disciplina de Antropologia ministrada no curso de ciências sociais da Universidade Estadual de Campinas, onde a turma deveria se organizar em trios e realizar um exercício de observação e elaboração de relato etnográfico, com uso de autores debatidos no decorrer do semestre; a respeito de qualquer questão que envolvesse um local e um grupo de pessoas ligadas a um tema, na qual não se tinha necessidade de nada exótico, uma vez que o espaço mais simples e cotidiano pode render observações interessantes, se pensado em seus pormenores.
Por algumas semanas permaneci sem uma idéia plausível, até assistir ao filme Câmera Olho. Digo que nele uma cena me surpreendeu; ao mostrar todo o processo de “ganho” da carne numa câmera acelerada, de trás pra frente, a partir da cena onde uma mulher trocava umas moedas por um pedaço de carne até o momento em que a vaca aparecia viva. O processo em si, embora visto por intermédio de uma tela inúmeras vezes, ainda ter despertado o famigerado asco misturado com angústia, mais que isto, o movimento da câmera que revertia as ações ganhou minha atenção. Eis o tema do trabalho delimitado: tinha me proposto então, a realizar um exercício de observação (tal qual aquele que se faz antes de adentrar num trabalho de campo) nos açougues de Campinas. Lembro ter partilhado a idéia com alguns colegas, a fim de fechar um grupo que não fosse fechado à proposta; a princípio recorri aos vegetarianos da sala, mas acabei agregando duas colegas que acolheram à idéia com aquilo que chamam de “mente aberta”.
Partíamos da idéia de fazer, então, a observação de locais que reúnem as práticas da venda e compra de carne - tais como supermercados e açougues – e, a partir da relação de consumo entre animais humanos e não-humanos, pensar a questão da elipse da conexão entre animal e carne - o rito de passagem - na ótica antropológica.
Dessa forma, a proposta trouxe idéias como traçar a ponte humano-animal-carne e a significação cultural dos objetos nos locais observados, numa reflexão sobre o que permite/valida o consumo de animais para fins alimentícios. Conforme os estudos e os autores que discorrem sobre o conceito de cultura foram assumindo um caráter diferenciado que se adequaram ao presente exercício de observação, este tomou por referencial teórico Marshall Sahlins, e a tese de mestrado de Juliana Vegueiro Dias, O Rigor da Morte: a Construção Simbólica do “Animal de Açougue” na Produção Industrial Brasileira. Estávamos ali com excelentes fontes, às quais recomendo enfaticamente. Faço aqui um parêntese, para dizer que revisando o trabalho a fim de estruturá-lo como artigo, reverti - na parte que segue, da descrição física da disposição da venda de carnes - os verbos no presente para o passado, a fim de relatar as observações que foram feitas no final de 2009. Lamento dizer que estas não se tratam de práticas que se limitam ao passado.
Começava então com a referência a Sahlins, que, por exemplo, analisando a sociedade americana em relação às suas preferências de comida e quanto aos tabus que essa sociedade sustenta, coloca: “[...] o ponto principal não é somente de interesse do consumo; a relação produtiva da sociedade americana com seu próprio meio ambiente e com o mundo é estabelecida por avaliações específicas de comestibilidade e não-comestibilidade [...][1]
A intenção aqui era a de lançar um olhar mais minucioso e atento sobre a peculiaridade do ato pelo qual animais humanos (vivos) consumem fragmentos de outros animais (mortos). Animais humanos: membros da espécie primata bípede, Homo sapiens. Outros animais: vacas, porcos, galinhas e peixes, sendo os dois primeiros mamíferos quadrúpedes, o terceiro bípede e o último, detentor de nadadeiras e brânquias. Todos são reunidos no reino Animalia. No entanto, nas últimas três semanas freqüentamos ambientes de consumo de itens cárneos, nos quais toda e qualquer referência à categoria animal parecia ser de fato, esquecida e posta de lado.
Nas observações feitas em campo, localizamos a “sessão de Carnes e aves” ocupando o canto esquerdo dos fundos do supermercado. O odor era anteriormente notado. Uma espécie de geladeira horizontal se encontrava no corredor, contendo músculos, articulações e órgãos tanto internos quanto externos de vacas, porcos e galinhas, eram dispostos em bandejas de isopor, revestidas por um plástico. A outra prateleira refrigerada era relativamente setorizada, distribuindo carnes vermelhas, brancas e miúdos, em trechos diferentes. Os corações de galinhas eram vendidos aos montes, em cima de uma poça de sangue, numa única embalagem.
Algumas carnes são embaladas num outro tipo de embalagem, à vácuo, de forma a evitar o escoamento do sangue, que encontramos em algumas bandejas. Ao lado das prateleiras, um rolo de embalagens plásticas ficava à disposição do cliente, caso este queira “reembalar” a embalagem. A noção de assepsia era forte, havia um certificado da vigilância sanitária ao lado do balcão, os funcionários de uniforme, touca e botas brancas.
Seguindo a diante, tínhamos um balcão onde os funcionários amolavam facas e davam pancadas surdas com a machadinha. Ali eram expostos fígados pendurados, perfurados por ganchos; outros músculos e tripas eram postos em bacias brancas, ao lado, a pele de porco também pendurada. O ambiente reunia vários elementos típicos da esfera estereotipada de construção da masculinidade na simbologia ocidental, das facas, do contanto direto com o sangue, do “sangue-frio”, enfim, de toda a chamada virilidade presente na categoria meat-eater / hunter[2].
Saindo da sessão de carnes e aves, logo se via, no lado oposto, uma vasta quantia de itens incrivelmente coloridos e mais atraentes que o normal. Frutas, verduras e legumes. No caminho, uma sessão nomeada “frios e embutidos”, onde mortadelas e presuntos eram pendurados no alto; nas prateleiras geladas, encontravam-se lingüiça, salsicha, azeitonas, maionese e comidas prontas. No mesmo ambiente, eram expostas carne-de-sol e bacon. Na frente dessa sessão, estava a de “Peixes”, curiosamente separada das “Carnes e aves”, como outra categoria de alimento. Ali, o mau-cheiro também é característico, as carnes de peixe pareciam ser mais congeladas que as outras, e se encontravam todas num fundo refrigerador[3].
Dos vestígios de alguma vida nos balcões assépticos, nas embalagens a
vácuo e no avental branco:
Pois parece, de fato, que toda a assepsia procura garantir ao consumidor que o objeto de consumo se mostre uma mercadoria comestível, sem qualquer outro destino prévio. A categoria que reúne os elementos que remetem ao animal enquanto ser outrora vivo é apagada do ambiente. A carne é consumida fora do contexto de tudo aquilo que indica a presença de um corpo, é retalhada em pedaços e formas neutras, quando não enlatada nos chamados embutidos. O sangue é evitado a todo custo, conforme aparecem as embalagens a vácuo e o cenário branco; a temperatura quente e viva da carne é revertida em itens refrigerados e congelados.
Os artefatos parecem circular, em grau máximo de afastamento do corpo e da vida dos animais. Na produção industrial se delineia, assim, a carne como um produto surgido ex nihilo – autônomo, independente, característico do “mundo das mercadorias” (DIAS: 2009, K.Marx, (1867) 1987). É possível perceber o consumo de carne enquanto algo possibilitado pela via da comodidade, seja pela disponibilidade no mercado, pela idéia de higienização do ambiente (da vigilância fiscal), ou mesmo pela simbologia envolvida na aparência do produto. Fatores que não deixam de ser comuns aos que influenciaram a transferência dos açougues comerciais para dentro dos supermercados.
Olhando mais atentamente às mercadorias acima descritas, percebíamos o sangue concentrado nas dobras da embalagem justa, as manchas de sangue no chão branco, o avental branco-amarelado e o mau-cheiro instalado a dois corredores de distância. Ainda, podia-se refletir sobre o mal-estar gerado em torno das semelhanças das partes do corpo animal (dispostas a venda) com o corpo humano dos próprios consumidores. Partes como língua, estômago, pé, entre outras, são algumas as quais a conexão perdida na elipse se dá mais espontaneamente, sendo elas
menos procuradas e consumidas, consideradas “comidas exóticas” pelos próprios funcionários do açougue.
Pensando a trajetória que antecede a mercadoria nas prateleiras, podemos citar a linha de (des)montagem trabalhada por Dias, que caracteriza o abate industrial de animais e não apenas introduz a alienação do trabalho humano, mas, como seu próprio nome indica, ao fragmentar o corpo animal em partes – a partir de que o todo é irreconhecível e irrecuperável -, materializa a alienação neste próprio corpo. Ou seja, em analogia ao argumento de K.Marx [(1867) 1987] em relação ao trabalho humano, o corpo animal também se torna um “hieróglifo social”.
“Tais disposições são etapas fundamentais na transformação simbólica do animal em carne. Retirar todo o sangue do animal, esvaziar de vida o corpo que antes se movia por conta própria, proporciona um distanciamento da idéia do animal vivo, aproximando a matéria inerte de um objeto artificialmente produzido. Trata-se, assim, de um processo de descaracterização progressiva do animal durante sua transformação em carne, como notou N.Vialles (1987), através da retirada das patas, da cabeça, pele e vísceras.”[4]
Temos, novamente, a dissociação entre o animal e o produto industrial classificado na categoria carne. Nas argumentações de DIAS (2009): oculta a morte, imediatizado o consumo, neutralizada a corruptabilidade da carne, esta se mostra cada vez mais como um produto como outro qualquer, produzido pela mão humana, do que com um produto de primeira natureza. A partir do que foi observado, o consumidor tem toda a indiferença necessária para eliminar quaisquer conexões entre animais e “peças”.
“Paralelamente a esse movimento de especialização e fragmentação da produção, Gustavus Franklin Swift, dono da fábrica que leva seu nome, desenvolveu uma técnica que efetivamente revolucionou o mercado de carnes: a carcaça, cortada em inúmeros pedaços, era agora apresentada ao consumidor como peças de carne, o que permitiu significativa elevação dos preços: “a melhor forma de atingir esse objetivo era cortar a carne esteticamente em pedaços, da forma mais atraente possível e expô-los pelo menor preço (W.Cronon, 1991: 237).”[5]
Apontado pela autora, este é o passo decisivo para a cisão entre a carne, enquanto produto industrial, e o animal, em sua integridade de corpo vivo. É demonstrada a transformação do animal em mercadoria comestível através de uma elipse lógica que mascara a passagem do ser vivo ao corpo morto, que segue inúmeras estratégias, as quais velam a forma real do corpo animal, na desenvoltura de um “mercado de pedaços” que suprime completamente a relação entre o fragmento e a totalidade de seu corpo. Existe aí toda uma lógica de produção simbólica em torno da mercadoria:
“De fato, como argumentou W.Cronon, o resultado mais importante da produção industrial de carne – mais do que a carne em si – é o esquecimento, este que faz o animal morrer duas vezes: uma primeira vez nas plataformas de matança e uma segunda, no pensamento dos consumidores.”[6]
Tal como Marshall Sahlins constata, o consumo de carne só poderia dar-se mediante à separação entre aquilo que se come e o que é determinado por uma interação comum entre homens e animais; Baudrillard coloca que da mesma maneira que a linguagem, o consumo é uma troca de significados onde a funcionalidade dos bens ocorre depois, se auto-ajustando.[7]
Bom, nesta conclusão apressada acabava o trabalho. Assim que impresso, foi apresentado em sala. Os demais colegas discorriam sobre seus temas, tais quais as visitas a espaços públicos frequentados por um determinado tipo de pessoas, às peculiares visitas a igrejas evangélicas neopentecostais, a lojas e shoppings, entre outros. Não pude deixar de notar expressões que iam do receio, à surpresa, ao nojo, ao quase-interesse e à aversão. Espero ter despertado um mínimo de incômodo naqueles que são agentes destas práticas, e com esse incômodo, um mínimo de reflexão, por que tudo aquilo que fazemos, por mais pessoal que pareça, não deixa de ser, sempre, um ato político; e como a antropologia estruturalista nos ensina, os atos são atos dotados de significação simbólica, e nada é mera funcionalidade.
Bibliografia
DIAS, Juliana Vergueiro. O Rigor da Morte: a construção Simbólica do “Animal de Açougue” na Produção Industrial Brasileira. Dissertação de mestrado apresentada ao Departamento de Antropologia Social do IFCH/UNICAMP, Fev. 2009
SAHLINS, Marshal. Cultura e Razão Prática. Rio de Janeiro. Zahar Editores S.A., 1979
Notas
[1] SAHLINS, Marshal. Cultura e Razão Prática. Rio de Janeiro. Zahar Editores S.A., 1979. P. 190
[2] Termos da literatura inglesa e norte-americana. O primeiro, procura designar a categoria aqueles que têm uma “cultura” da presença de carne reforçada na dieta onívora; o segundo, termo para caçador.
[3] As informações e impressões colhidas em campo, talvez pela escolha do ambiente deste, de certa forma, acabaram sendo bastante homogêneas nos dois supermercados, com alguma diferenciação nos açougues também visitados.
[4] DIAS, Juliana Vergueiro. O Rigor da Morte: a construção Simbólica do “Animal de Açougue” na Produção Industrial Brasileira. Dissertação de mestrado apresentada ao Departamento de Antropologia Social do IFCH/UNICAMP, Fev. 2009. p. 54
[5] DIAS: 2009, Op. Cit. p. 28
[6] Idem.
[7] SAHLINS: 1979, Op. Cit. p. 197
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Giulia Bauab Levai é graduanda em ciências sociais, Universidade Estadual de Campinas. E-mail: giulialevai@hotmail.com
Giulia Bauab Levai
Também disponível em http://migre.me/MZa1
O presente artigo surgiu na necessidade de se fazer um trabalho final em uma disciplina de Antropologia ministrada no curso de ciências sociais da Universidade Estadual de Campinas, onde a turma deveria se organizar em trios e realizar um exercício de observação e elaboração de relato etnográfico, com uso de autores debatidos no decorrer do semestre; a respeito de qualquer questão que envolvesse um local e um grupo de pessoas ligadas a um tema, na qual não se tinha necessidade de nada exótico, uma vez que o espaço mais simples e cotidiano pode render observações interessantes, se pensado em seus pormenores.
Por algumas semanas permaneci sem uma idéia plausível, até assistir ao filme Câmera Olho. Digo que nele uma cena me surpreendeu; ao mostrar todo o processo de “ganho” da carne numa câmera acelerada, de trás pra frente, a partir da cena onde uma mulher trocava umas moedas por um pedaço de carne até o momento em que a vaca aparecia viva. O processo em si, embora visto por intermédio de uma tela inúmeras vezes, ainda ter despertado o famigerado asco misturado com angústia, mais que isto, o movimento da câmera que revertia as ações ganhou minha atenção. Eis o tema do trabalho delimitado: tinha me proposto então, a realizar um exercício de observação (tal qual aquele que se faz antes de adentrar num trabalho de campo) nos açougues de Campinas. Lembro ter partilhado a idéia com alguns colegas, a fim de fechar um grupo que não fosse fechado à proposta; a princípio recorri aos vegetarianos da sala, mas acabei agregando duas colegas que acolheram à idéia com aquilo que chamam de “mente aberta”.
Partíamos da idéia de fazer, então, a observação de locais que reúnem as práticas da venda e compra de carne - tais como supermercados e açougues – e, a partir da relação de consumo entre animais humanos e não-humanos, pensar a questão da elipse da conexão entre animal e carne - o rito de passagem - na ótica antropológica.
Dessa forma, a proposta trouxe idéias como traçar a ponte humano-animal-carne e a significação cultural dos objetos nos locais observados, numa reflexão sobre o que permite/valida o consumo de animais para fins alimentícios. Conforme os estudos e os autores que discorrem sobre o conceito de cultura foram assumindo um caráter diferenciado que se adequaram ao presente exercício de observação, este tomou por referencial teórico Marshall Sahlins, e a tese de mestrado de Juliana Vegueiro Dias, O Rigor da Morte: a Construção Simbólica do “Animal de Açougue” na Produção Industrial Brasileira. Estávamos ali com excelentes fontes, às quais recomendo enfaticamente. Faço aqui um parêntese, para dizer que revisando o trabalho a fim de estruturá-lo como artigo, reverti - na parte que segue, da descrição física da disposição da venda de carnes - os verbos no presente para o passado, a fim de relatar as observações que foram feitas no final de 2009. Lamento dizer que estas não se tratam de práticas que se limitam ao passado.
Começava então com a referência a Sahlins, que, por exemplo, analisando a sociedade americana em relação às suas preferências de comida e quanto aos tabus que essa sociedade sustenta, coloca: “[...] o ponto principal não é somente de interesse do consumo; a relação produtiva da sociedade americana com seu próprio meio ambiente e com o mundo é estabelecida por avaliações específicas de comestibilidade e não-comestibilidade [...][1]
A intenção aqui era a de lançar um olhar mais minucioso e atento sobre a peculiaridade do ato pelo qual animais humanos (vivos) consumem fragmentos de outros animais (mortos). Animais humanos: membros da espécie primata bípede, Homo sapiens. Outros animais: vacas, porcos, galinhas e peixes, sendo os dois primeiros mamíferos quadrúpedes, o terceiro bípede e o último, detentor de nadadeiras e brânquias. Todos são reunidos no reino Animalia. No entanto, nas últimas três semanas freqüentamos ambientes de consumo de itens cárneos, nos quais toda e qualquer referência à categoria animal parecia ser de fato, esquecida e posta de lado.
Nas observações feitas em campo, localizamos a “sessão de Carnes e aves” ocupando o canto esquerdo dos fundos do supermercado. O odor era anteriormente notado. Uma espécie de geladeira horizontal se encontrava no corredor, contendo músculos, articulações e órgãos tanto internos quanto externos de vacas, porcos e galinhas, eram dispostos em bandejas de isopor, revestidas por um plástico. A outra prateleira refrigerada era relativamente setorizada, distribuindo carnes vermelhas, brancas e miúdos, em trechos diferentes. Os corações de galinhas eram vendidos aos montes, em cima de uma poça de sangue, numa única embalagem.
Algumas carnes são embaladas num outro tipo de embalagem, à vácuo, de forma a evitar o escoamento do sangue, que encontramos em algumas bandejas. Ao lado das prateleiras, um rolo de embalagens plásticas ficava à disposição do cliente, caso este queira “reembalar” a embalagem. A noção de assepsia era forte, havia um certificado da vigilância sanitária ao lado do balcão, os funcionários de uniforme, touca e botas brancas.
Seguindo a diante, tínhamos um balcão onde os funcionários amolavam facas e davam pancadas surdas com a machadinha. Ali eram expostos fígados pendurados, perfurados por ganchos; outros músculos e tripas eram postos em bacias brancas, ao lado, a pele de porco também pendurada. O ambiente reunia vários elementos típicos da esfera estereotipada de construção da masculinidade na simbologia ocidental, das facas, do contanto direto com o sangue, do “sangue-frio”, enfim, de toda a chamada virilidade presente na categoria meat-eater / hunter[2].
Saindo da sessão de carnes e aves, logo se via, no lado oposto, uma vasta quantia de itens incrivelmente coloridos e mais atraentes que o normal. Frutas, verduras e legumes. No caminho, uma sessão nomeada “frios e embutidos”, onde mortadelas e presuntos eram pendurados no alto; nas prateleiras geladas, encontravam-se lingüiça, salsicha, azeitonas, maionese e comidas prontas. No mesmo ambiente, eram expostas carne-de-sol e bacon. Na frente dessa sessão, estava a de “Peixes”, curiosamente separada das “Carnes e aves”, como outra categoria de alimento. Ali, o mau-cheiro também é característico, as carnes de peixe pareciam ser mais congeladas que as outras, e se encontravam todas num fundo refrigerador[3].
Dos vestígios de alguma vida nos balcões assépticos, nas embalagens a
vácuo e no avental branco:
Pois parece, de fato, que toda a assepsia procura garantir ao consumidor que o objeto de consumo se mostre uma mercadoria comestível, sem qualquer outro destino prévio. A categoria que reúne os elementos que remetem ao animal enquanto ser outrora vivo é apagada do ambiente. A carne é consumida fora do contexto de tudo aquilo que indica a presença de um corpo, é retalhada em pedaços e formas neutras, quando não enlatada nos chamados embutidos. O sangue é evitado a todo custo, conforme aparecem as embalagens a vácuo e o cenário branco; a temperatura quente e viva da carne é revertida em itens refrigerados e congelados.
Os artefatos parecem circular, em grau máximo de afastamento do corpo e da vida dos animais. Na produção industrial se delineia, assim, a carne como um produto surgido ex nihilo – autônomo, independente, característico do “mundo das mercadorias” (DIAS: 2009, K.Marx, (1867) 1987). É possível perceber o consumo de carne enquanto algo possibilitado pela via da comodidade, seja pela disponibilidade no mercado, pela idéia de higienização do ambiente (da vigilância fiscal), ou mesmo pela simbologia envolvida na aparência do produto. Fatores que não deixam de ser comuns aos que influenciaram a transferência dos açougues comerciais para dentro dos supermercados.
Olhando mais atentamente às mercadorias acima descritas, percebíamos o sangue concentrado nas dobras da embalagem justa, as manchas de sangue no chão branco, o avental branco-amarelado e o mau-cheiro instalado a dois corredores de distância. Ainda, podia-se refletir sobre o mal-estar gerado em torno das semelhanças das partes do corpo animal (dispostas a venda) com o corpo humano dos próprios consumidores. Partes como língua, estômago, pé, entre outras, são algumas as quais a conexão perdida na elipse se dá mais espontaneamente, sendo elas
menos procuradas e consumidas, consideradas “comidas exóticas” pelos próprios funcionários do açougue.
Pensando a trajetória que antecede a mercadoria nas prateleiras, podemos citar a linha de (des)montagem trabalhada por Dias, que caracteriza o abate industrial de animais e não apenas introduz a alienação do trabalho humano, mas, como seu próprio nome indica, ao fragmentar o corpo animal em partes – a partir de que o todo é irreconhecível e irrecuperável -, materializa a alienação neste próprio corpo. Ou seja, em analogia ao argumento de K.Marx [(1867) 1987] em relação ao trabalho humano, o corpo animal também se torna um “hieróglifo social”.
“Tais disposições são etapas fundamentais na transformação simbólica do animal em carne. Retirar todo o sangue do animal, esvaziar de vida o corpo que antes se movia por conta própria, proporciona um distanciamento da idéia do animal vivo, aproximando a matéria inerte de um objeto artificialmente produzido. Trata-se, assim, de um processo de descaracterização progressiva do animal durante sua transformação em carne, como notou N.Vialles (1987), através da retirada das patas, da cabeça, pele e vísceras.”[4]
Temos, novamente, a dissociação entre o animal e o produto industrial classificado na categoria carne. Nas argumentações de DIAS (2009): oculta a morte, imediatizado o consumo, neutralizada a corruptabilidade da carne, esta se mostra cada vez mais como um produto como outro qualquer, produzido pela mão humana, do que com um produto de primeira natureza. A partir do que foi observado, o consumidor tem toda a indiferença necessária para eliminar quaisquer conexões entre animais e “peças”.
“Paralelamente a esse movimento de especialização e fragmentação da produção, Gustavus Franklin Swift, dono da fábrica que leva seu nome, desenvolveu uma técnica que efetivamente revolucionou o mercado de carnes: a carcaça, cortada em inúmeros pedaços, era agora apresentada ao consumidor como peças de carne, o que permitiu significativa elevação dos preços: “a melhor forma de atingir esse objetivo era cortar a carne esteticamente em pedaços, da forma mais atraente possível e expô-los pelo menor preço (W.Cronon, 1991: 237).”[5]
Apontado pela autora, este é o passo decisivo para a cisão entre a carne, enquanto produto industrial, e o animal, em sua integridade de corpo vivo. É demonstrada a transformação do animal em mercadoria comestível através de uma elipse lógica que mascara a passagem do ser vivo ao corpo morto, que segue inúmeras estratégias, as quais velam a forma real do corpo animal, na desenvoltura de um “mercado de pedaços” que suprime completamente a relação entre o fragmento e a totalidade de seu corpo. Existe aí toda uma lógica de produção simbólica em torno da mercadoria:
“De fato, como argumentou W.Cronon, o resultado mais importante da produção industrial de carne – mais do que a carne em si – é o esquecimento, este que faz o animal morrer duas vezes: uma primeira vez nas plataformas de matança e uma segunda, no pensamento dos consumidores.”[6]
Tal como Marshall Sahlins constata, o consumo de carne só poderia dar-se mediante à separação entre aquilo que se come e o que é determinado por uma interação comum entre homens e animais; Baudrillard coloca que da mesma maneira que a linguagem, o consumo é uma troca de significados onde a funcionalidade dos bens ocorre depois, se auto-ajustando.[7]
Bom, nesta conclusão apressada acabava o trabalho. Assim que impresso, foi apresentado em sala. Os demais colegas discorriam sobre seus temas, tais quais as visitas a espaços públicos frequentados por um determinado tipo de pessoas, às peculiares visitas a igrejas evangélicas neopentecostais, a lojas e shoppings, entre outros. Não pude deixar de notar expressões que iam do receio, à surpresa, ao nojo, ao quase-interesse e à aversão. Espero ter despertado um mínimo de incômodo naqueles que são agentes destas práticas, e com esse incômodo, um mínimo de reflexão, por que tudo aquilo que fazemos, por mais pessoal que pareça, não deixa de ser, sempre, um ato político; e como a antropologia estruturalista nos ensina, os atos são atos dotados de significação simbólica, e nada é mera funcionalidade.
Bibliografia
DIAS, Juliana Vergueiro. O Rigor da Morte: a construção Simbólica do “Animal de Açougue” na Produção Industrial Brasileira. Dissertação de mestrado apresentada ao Departamento de Antropologia Social do IFCH/UNICAMP, Fev. 2009
SAHLINS, Marshal. Cultura e Razão Prática. Rio de Janeiro. Zahar Editores S.A., 1979
Notas
[1] SAHLINS, Marshal. Cultura e Razão Prática. Rio de Janeiro. Zahar Editores S.A., 1979. P. 190
[2] Termos da literatura inglesa e norte-americana. O primeiro, procura designar a categoria aqueles que têm uma “cultura” da presença de carne reforçada na dieta onívora; o segundo, termo para caçador.
[3] As informações e impressões colhidas em campo, talvez pela escolha do ambiente deste, de certa forma, acabaram sendo bastante homogêneas nos dois supermercados, com alguma diferenciação nos açougues também visitados.
[4] DIAS, Juliana Vergueiro. O Rigor da Morte: a construção Simbólica do “Animal de Açougue” na Produção Industrial Brasileira. Dissertação de mestrado apresentada ao Departamento de Antropologia Social do IFCH/UNICAMP, Fev. 2009. p. 54
[5] DIAS: 2009, Op. Cit. p. 28
[6] Idem.
[7] SAHLINS: 1979, Op. Cit. p. 197
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Giulia Bauab Levai é graduanda em ciências sociais, Universidade Estadual de Campinas. E-mail: giulialevai@hotmail.com
COISAS QUE POSSUEM MENTE
COISAS QUE POSSUEM MENTE
Luciano Carlos Cunha
Você já se perguntou o que faz com que alguém seja vendido?
É claro. Todos nós vivemos num mundo onde estamos rodeados o tempo todo por coisas que são vendidas. As coisas vendidas são chamadas mercadorias. Nascemos e vivemos tão acostumados com isso que talvez nunca tenhamos parado para pensar para que serve o conceito de mercadoria.
Bom. Para começar, uma mercadoria é um item de propriedade, e como tal, ela tem um dono, um proprietário. Mas, vamos lembrar de onde iniciamos a questão: "o que faz com que alguém seja vendido?". Uma mercadoria só é vendida por um preço, um valor. E uma mercadoria só é mercadoria por ter um valor que está fora dela. Os outros dão esse valor. Dependendo do quanto a mercadoria favoreça aos interesses do seu proprietário, ela será mais ou menos valorizada. Por definição, um item de propriedade é algo que só tem valor instrumental, condicional, extrínseco. É por isso também que uma mercadoria é chamada uma coisa. Compreendemos bem quando dizemos isso de um relógio ou de uma laranja. Nem um relógio nem uma laranja conseguem ver valor em sua própria existência, porque falta-lhes uma mente. Assim, os donos de relógios e laranjas podem fazer o que bem entenderem com seus itens de propriedade (vender, dar, trocar e até mesmo destruir), pois esses itens não podem sofrer um mal1.
Até aí parece tudo muito simples. Mas, a coisa fica intrigante quando perguntamos porque é que alguns seres que claramente possuem uma mente são vendidos. Se são vendidos, é porque são considerados coisas - o comprador tem o direito de propriedade sobre a coisa, e pode fazer com ela o que bem entender. Aqueles seres vivos que separam-se de sua fonte de provimento ao nascerem precisam da mente para moverem-se com segurança no ambiente2. É por isso que os chamamos animais, pois são animados (dotados de movimento por ação própria - diferentemente por exemplo, de um cata-ventos, que só pode mover-se por forças externas). E é claro, seres humanos também estão incluídos nessa categoria de seres animados.
A nossa busca está cada vez mais intrigante porque, claramente vemos que em nossa sociedade, alguns animais são vendidos e com relação a outros, achamos repugnante a idéia de vendê-los. Se quisermos sustentar firmemente nossa posição, para não sermos acusados de irracionalidade, precisamos demonstrar alguma diferença que exista entre os animais que podem ser vendidos e os que não podem. Uma diferença que diga que alguns animais devem ser agrupados junto com relógios e laranjas e que outros animais são tão diferentes dos primeiros que devem ser colocados em um grupo separado.
Podemos iniciar nossa análise com relação aos seres humanos. Há algum tempo atrás (e não faz muito tempo), humanos de pele negra eram considerados itens de propriedade dos humanos de pele branca. Também as mulheres, já foram consideradas itens de propriedade dos homens. Hoje em dia, achamos repugnante a idéia de que um ser humano possa ser vendido. A noção de que cada um de nós possui uma existência psicológica (e não meramente biológica como uma laranja, por exemplo) faz nos enxergarmos como possuindo o direito de não sermos utilizados como se fôssemos uma mercadoria, uma fonte renovável, um modelo de testes, como se só tivéssemos valor enquanto servíssemos aos interesses dos outros, enfim, como se fôssemos meros meios para fins de outros3. É por esse motivo que consideramos a escravidão como algo repugnante: diferentemente de laranjas ou relógios, nos importamos com o que acontece conosco, e podemos ser atingidos maleficamente por alguma ação ou omissão de terceiros. Por possuirmos um bem-próprio e nos importarmos com o que acontece conosco, nosso valor é inerente4, e não instrumental. Sentimos que nossa vida, integridade física e liberdade de movimento não têm preço. Elas não podem ser compradas.
Tratar um indivíduo que possui uma mente como se fosse uma mercadoria é rebaixá-lo ao estatuto de coisa, é mostrar desrespeito pelos seu valor inerente e seus interesses. Quando se trata de seres humanos, nós concordamos prontamente com todos esses princípios. Mas, se somos realmente racionais, precisamos então explicar porque deveria ser diferente com relação a membros de outras espécies. Em suma, por que respeitar um interesse de não ser usado como uma coisa, de não ser escravizado, em um ser de nossa espécie, e não no de outra? O que nos torna tão especiais?
Alguns dizem: é porque humanos são de nossa espécie. Mas isso é como dizer que "humanos são humanos", e isso já sabemos. Queremos saber o que torna todos os humanos tão especiais. Muitos apontam a capacidade para a razão plena. Mas assim estariam excluídos nossos bebês, as crianças muito pequenas, os humanos com graves lesões cerebrais, e os idosos senis. Além disso, muitos animais não-humanos possuem níveis de raciocínio muito acima do deles. Idosos senis podem já ter tido a razão desenvolvida um dia e bebês saudáveis podem ainda vir a desenvolvê-la, mas certos humanos passarão a vida inteira no mesmo estado (de não ter a posse plena da razão mas poder desfrutar de sua vida prazerosamente) e nem por isso os utilizamos como se fossem nossos recursos. Resumindo, não há como traçar uma linha divisória com base em capacidades cognitivas, que coloque todos os humanos acima da linha e todos os não-humanos abaixo5.
As tentativas do parágrafo anterior de apontar uma diferença entre humanos e não-humanos não foram bem-sucedidas porque tiravam uma conclusão que não tinha a ver com o assunto das premissas. As premissas diziam respeito a alguém por esse alguém ter o interesse em não ser usado como se fosse uma coisa, e a capacidade para a razão plena nada tem a ver com isso. Para sofrer um mal, basta ser senciente (possuir a capacidade de sofrer/ desfrutar da vida). Nisso, nos igualamos aos outros animais, pois somos dotados de mente. Se não conseguimos apontar uma diferença moralmente relevante entre humanos e não-humanos que justifique a diferença no tratamento, é sinal de que nós, que nos auto-proclamamos racionais, estamos embasados num preconceito irracional, de aparências: o especismo6, (assim como o racismo e o sexismo). Se não há mérito ou demérito por alguém ter nascido com este ou aquele formato de corpo (raça, sexo ou espécie), pois, não resulta de investimento pessoal7 (qualquer um de nós poderia ter nascido com rabo, patas e bico), como usar essas características para justificar usar o outro como se fosse uma coisa? Dessa forma, se somos racionais, precisamos estender aos não-humanos o mesmo direito moral básico8 de não ser usado como mero meio para fins de outros (por exemplo, como um item de propriedade), seja para qual fim for: alimentação, experimentos, vestimenta, entretenimento. E não importa se essas práticas são feitas sem dor ou não, com morte ou não: todas elas violam o princípio básico de que seres com uma mente não são coisas.
Ainda há outra questão intrigante. Algumas pessoas defendem que é errado escravizar, torturar, matar, vender seres humanos e certos seres não-humanos (como cachorros ou gatos), mas não vêem nada de errado em fazer isso com galinhas, bois, vacas, porcos, etc. Essa diferenciação é ainda mais difícil de entender, e não pode ser explicada a não ser por um outro preconceito semelhante ao primeiro tipo de especismo (o elitista, que coloca os seres humanos como uma elite): o especismo eletivo9 (onde se escolhe uma espécie para respeitar enquanto se continua a fazer uso de todas as outras). Isso só pode ser explicado através de uma preferência sentimental que alguns tem por certos formatos de corpo. Não haveria problema algum com essa preferência se as pessoas não pensassem que o respeito que elas devem se mede pela quantidade de amor que elas sentem. Amar é opção, respeitar é dever10. E o respeito depende apenas das características do paciente da ação (se este pode ou não sofrer um mal), e não de sensações subjetivas na mente do agente (porque o paciente pode continuar a sofrer o mal, quer o amemos, quer o odiemos).
Assim sendo, a única posição coerente, com relação ao que estávamos investigando sobre o conceito de propriedade é: separarmos de um lado, as coisas (sem mente) que podem ser itens de propriedade e de outro, os indivíduos (que passam a ter o direito de não serem usados). Com isso, necessitamos da abolição11 do uso de animais (tanto humanos quanto não humanos) enquanto itens de propriedade de seres humanos, não meramente sua regulamentação (pois nenhum defensor sério dos direitos humanos defende a regulamentação do estupro), simplesmente porque regulamentar a escravidão é torná-la mais forte e mais bem-vista aos olhos do público.
Notas
1 Cf. Gary L. FRANCIONE. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000, capítulo 3.
2 Sobre essa definição de animal, ver Arthur SCHOPENHAUER. O Mundo Como Vontade e Como Representação. São Paulo, Unesp, 2005, p. 214-215.
3 Cf. Tom REGAN. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 85.
4 Id, p. 84.
5 Cf. Peter SINGER. The Significance of Animal Suffering. In: BAIRD, Rober M. & ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. Amherst, NY: Prometheus Books, 1991, p. 57.
6 Cf. Richard D. RYDER. Speciesism. In: ________. Victims of Science: the use of animals inresearch [1975]. Revised edition 1983. London: Centaur Press; National Anti-Vivisection Society Limited, 1983, p. 5.
7 Cf. FELIPE, Sônia T. . Fundamentação ética dos direitos animais. O legado de Humphry Primatt. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 1, 2006, p. 219.
8 Cf. Gary L. FRANCIONE. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000, p. 92-102.
9 Os termos especismo elitista e especismo eletivo são utilizados pela filósofa Sônia T. FELIPE. Ver entrevista em http://www.pensataanimal.net/index.php?option=com_content&view=article&id=66:
filosofacritica&catid=84:soniatfelipe&Itemid=27
10 Agradeço a sugestão dessa frase a Maurício Varallo.
11 Cf. Tom REGAN. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 77.
Referências
FELIPE, Sônia T. . Fundamentação ética dos direitos animais. O legado de Humphry Primatt. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 1, p. 207-230, 2006.
FRANCIONE, Gary L. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000.
REGAN, Tom. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 77-88.
RYDER, Richard D. Speciesism. In: ________. Victms of Science: the use of animals in research [1975]. Revised edition 1983. London: Centaur Press; National Anti-Vivisection Society Limited, 1983, p. 1-14
SCHOPENHAUER, Arthur. O Mundo Como Vontade e Como Representação. São Paulo, Unesp, 2005
SINGER, Peter. The Significance of Animal Suffering. In: BAIRD, Rober M. & ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. Amherst, NY: Prometheus Books, 1991, pp 57-65.
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Luciano Carlos Cunha - luciano@pensataanimal.net
Mestre em Ética pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), licenciado em Educação Artística com habilitação em música pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e colaborador da revista Pensata Animal.
Luciano Carlos Cunha
Você já se perguntou o que faz com que alguém seja vendido?
É claro. Todos nós vivemos num mundo onde estamos rodeados o tempo todo por coisas que são vendidas. As coisas vendidas são chamadas mercadorias. Nascemos e vivemos tão acostumados com isso que talvez nunca tenhamos parado para pensar para que serve o conceito de mercadoria.
Bom. Para começar, uma mercadoria é um item de propriedade, e como tal, ela tem um dono, um proprietário. Mas, vamos lembrar de onde iniciamos a questão: "o que faz com que alguém seja vendido?". Uma mercadoria só é vendida por um preço, um valor. E uma mercadoria só é mercadoria por ter um valor que está fora dela. Os outros dão esse valor. Dependendo do quanto a mercadoria favoreça aos interesses do seu proprietário, ela será mais ou menos valorizada. Por definição, um item de propriedade é algo que só tem valor instrumental, condicional, extrínseco. É por isso também que uma mercadoria é chamada uma coisa. Compreendemos bem quando dizemos isso de um relógio ou de uma laranja. Nem um relógio nem uma laranja conseguem ver valor em sua própria existência, porque falta-lhes uma mente. Assim, os donos de relógios e laranjas podem fazer o que bem entenderem com seus itens de propriedade (vender, dar, trocar e até mesmo destruir), pois esses itens não podem sofrer um mal1.
Até aí parece tudo muito simples. Mas, a coisa fica intrigante quando perguntamos porque é que alguns seres que claramente possuem uma mente são vendidos. Se são vendidos, é porque são considerados coisas - o comprador tem o direito de propriedade sobre a coisa, e pode fazer com ela o que bem entender. Aqueles seres vivos que separam-se de sua fonte de provimento ao nascerem precisam da mente para moverem-se com segurança no ambiente2. É por isso que os chamamos animais, pois são animados (dotados de movimento por ação própria - diferentemente por exemplo, de um cata-ventos, que só pode mover-se por forças externas). E é claro, seres humanos também estão incluídos nessa categoria de seres animados.
A nossa busca está cada vez mais intrigante porque, claramente vemos que em nossa sociedade, alguns animais são vendidos e com relação a outros, achamos repugnante a idéia de vendê-los. Se quisermos sustentar firmemente nossa posição, para não sermos acusados de irracionalidade, precisamos demonstrar alguma diferença que exista entre os animais que podem ser vendidos e os que não podem. Uma diferença que diga que alguns animais devem ser agrupados junto com relógios e laranjas e que outros animais são tão diferentes dos primeiros que devem ser colocados em um grupo separado.
Podemos iniciar nossa análise com relação aos seres humanos. Há algum tempo atrás (e não faz muito tempo), humanos de pele negra eram considerados itens de propriedade dos humanos de pele branca. Também as mulheres, já foram consideradas itens de propriedade dos homens. Hoje em dia, achamos repugnante a idéia de que um ser humano possa ser vendido. A noção de que cada um de nós possui uma existência psicológica (e não meramente biológica como uma laranja, por exemplo) faz nos enxergarmos como possuindo o direito de não sermos utilizados como se fôssemos uma mercadoria, uma fonte renovável, um modelo de testes, como se só tivéssemos valor enquanto servíssemos aos interesses dos outros, enfim, como se fôssemos meros meios para fins de outros3. É por esse motivo que consideramos a escravidão como algo repugnante: diferentemente de laranjas ou relógios, nos importamos com o que acontece conosco, e podemos ser atingidos maleficamente por alguma ação ou omissão de terceiros. Por possuirmos um bem-próprio e nos importarmos com o que acontece conosco, nosso valor é inerente4, e não instrumental. Sentimos que nossa vida, integridade física e liberdade de movimento não têm preço. Elas não podem ser compradas.
Tratar um indivíduo que possui uma mente como se fosse uma mercadoria é rebaixá-lo ao estatuto de coisa, é mostrar desrespeito pelos seu valor inerente e seus interesses. Quando se trata de seres humanos, nós concordamos prontamente com todos esses princípios. Mas, se somos realmente racionais, precisamos então explicar porque deveria ser diferente com relação a membros de outras espécies. Em suma, por que respeitar um interesse de não ser usado como uma coisa, de não ser escravizado, em um ser de nossa espécie, e não no de outra? O que nos torna tão especiais?
Alguns dizem: é porque humanos são de nossa espécie. Mas isso é como dizer que "humanos são humanos", e isso já sabemos. Queremos saber o que torna todos os humanos tão especiais. Muitos apontam a capacidade para a razão plena. Mas assim estariam excluídos nossos bebês, as crianças muito pequenas, os humanos com graves lesões cerebrais, e os idosos senis. Além disso, muitos animais não-humanos possuem níveis de raciocínio muito acima do deles. Idosos senis podem já ter tido a razão desenvolvida um dia e bebês saudáveis podem ainda vir a desenvolvê-la, mas certos humanos passarão a vida inteira no mesmo estado (de não ter a posse plena da razão mas poder desfrutar de sua vida prazerosamente) e nem por isso os utilizamos como se fossem nossos recursos. Resumindo, não há como traçar uma linha divisória com base em capacidades cognitivas, que coloque todos os humanos acima da linha e todos os não-humanos abaixo5.
As tentativas do parágrafo anterior de apontar uma diferença entre humanos e não-humanos não foram bem-sucedidas porque tiravam uma conclusão que não tinha a ver com o assunto das premissas. As premissas diziam respeito a alguém por esse alguém ter o interesse em não ser usado como se fosse uma coisa, e a capacidade para a razão plena nada tem a ver com isso. Para sofrer um mal, basta ser senciente (possuir a capacidade de sofrer/ desfrutar da vida). Nisso, nos igualamos aos outros animais, pois somos dotados de mente. Se não conseguimos apontar uma diferença moralmente relevante entre humanos e não-humanos que justifique a diferença no tratamento, é sinal de que nós, que nos auto-proclamamos racionais, estamos embasados num preconceito irracional, de aparências: o especismo6, (assim como o racismo e o sexismo). Se não há mérito ou demérito por alguém ter nascido com este ou aquele formato de corpo (raça, sexo ou espécie), pois, não resulta de investimento pessoal7 (qualquer um de nós poderia ter nascido com rabo, patas e bico), como usar essas características para justificar usar o outro como se fosse uma coisa? Dessa forma, se somos racionais, precisamos estender aos não-humanos o mesmo direito moral básico8 de não ser usado como mero meio para fins de outros (por exemplo, como um item de propriedade), seja para qual fim for: alimentação, experimentos, vestimenta, entretenimento. E não importa se essas práticas são feitas sem dor ou não, com morte ou não: todas elas violam o princípio básico de que seres com uma mente não são coisas.
Ainda há outra questão intrigante. Algumas pessoas defendem que é errado escravizar, torturar, matar, vender seres humanos e certos seres não-humanos (como cachorros ou gatos), mas não vêem nada de errado em fazer isso com galinhas, bois, vacas, porcos, etc. Essa diferenciação é ainda mais difícil de entender, e não pode ser explicada a não ser por um outro preconceito semelhante ao primeiro tipo de especismo (o elitista, que coloca os seres humanos como uma elite): o especismo eletivo9 (onde se escolhe uma espécie para respeitar enquanto se continua a fazer uso de todas as outras). Isso só pode ser explicado através de uma preferência sentimental que alguns tem por certos formatos de corpo. Não haveria problema algum com essa preferência se as pessoas não pensassem que o respeito que elas devem se mede pela quantidade de amor que elas sentem. Amar é opção, respeitar é dever10. E o respeito depende apenas das características do paciente da ação (se este pode ou não sofrer um mal), e não de sensações subjetivas na mente do agente (porque o paciente pode continuar a sofrer o mal, quer o amemos, quer o odiemos).
Assim sendo, a única posição coerente, com relação ao que estávamos investigando sobre o conceito de propriedade é: separarmos de um lado, as coisas (sem mente) que podem ser itens de propriedade e de outro, os indivíduos (que passam a ter o direito de não serem usados). Com isso, necessitamos da abolição11 do uso de animais (tanto humanos quanto não humanos) enquanto itens de propriedade de seres humanos, não meramente sua regulamentação (pois nenhum defensor sério dos direitos humanos defende a regulamentação do estupro), simplesmente porque regulamentar a escravidão é torná-la mais forte e mais bem-vista aos olhos do público.
Notas
1 Cf. Gary L. FRANCIONE. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000, capítulo 3.
2 Sobre essa definição de animal, ver Arthur SCHOPENHAUER. O Mundo Como Vontade e Como Representação. São Paulo, Unesp, 2005, p. 214-215.
3 Cf. Tom REGAN. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 85.
4 Id, p. 84.
5 Cf. Peter SINGER. The Significance of Animal Suffering. In: BAIRD, Rober M. & ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. Amherst, NY: Prometheus Books, 1991, p. 57.
6 Cf. Richard D. RYDER. Speciesism. In: ________. Victims of Science: the use of animals inresearch [1975]. Revised edition 1983. London: Centaur Press; National Anti-Vivisection Society Limited, 1983, p. 5.
7 Cf. FELIPE, Sônia T. . Fundamentação ética dos direitos animais. O legado de Humphry Primatt. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 1, 2006, p. 219.
8 Cf. Gary L. FRANCIONE. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000, p. 92-102.
9 Os termos especismo elitista e especismo eletivo são utilizados pela filósofa Sônia T. FELIPE. Ver entrevista em http://www.pensataanimal.net/index.php?option=com_content&view=article&id=66:
filosofacritica&catid=84:soniatfelipe&Itemid=27
10 Agradeço a sugestão dessa frase a Maurício Varallo.
11 Cf. Tom REGAN. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 77.
Referências
FELIPE, Sônia T. . Fundamentação ética dos direitos animais. O legado de Humphry Primatt. Revista Brasileira de Direito Animal, v. 1, p. 207-230, 2006.
FRANCIONE, Gary L. Introduction to Animal Rights: Your Child or the Dog? - Philadelphia: Temple University Press, 2000.
REGAN, Tom. The Case for Animal Rights. In: BAIRD, Robert M.; ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. New York: Amherst, 1991, p. 77-88.
RYDER, Richard D. Speciesism. In: ________. Victms of Science: the use of animals in research [1975]. Revised edition 1983. London: Centaur Press; National Anti-Vivisection Society Limited, 1983, p. 1-14
SCHOPENHAUER, Arthur. O Mundo Como Vontade e Como Representação. São Paulo, Unesp, 2005
SINGER, Peter. The Significance of Animal Suffering. In: BAIRD, Rober M. & ROSEMBAUM, Stuart E. (Eds.) Animal Experimentation: The Moral Issues. Amherst, NY: Prometheus Books, 1991, pp 57-65.
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Luciano Carlos Cunha - luciano@pensataanimal.net
Mestre em Ética pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), licenciado em Educação Artística com habilitação em música pela Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e colaborador da revista Pensata Animal.
quarta-feira, 9 de junho de 2010
TRANQUILIZANDO OS ANIMAIS DURANTE A COPA
TRANQUILIZANDO OS ANIMAIS DURANTE A COPA
Propomo-nos a conscientizar o maior número possível de pessoas sobre os danos que causamos aos animais ao usar pirotecnia, para que durante a Copa do Mundo eles não sofram. Nas festas de fim de ano vimos as consequências da infeliz pirotecnia: cachorros perdidos, atropelados, aturdidos e agonizando longe de seus guardiães - que nunca mais encontrarão.
Quando você pratica a pirotecnia, cachorros, gatos, cavalos sentem: palpitações, taquicardia, salivação, tremores, sensação de insuficiência respiratória, falta de ar, náuseas, atordoamento, sensação de irrealidade, perda de controle, medo de morrer.
Essas alterações provocam na conduta do animal tentativas descontroladas de escapar, incentivada pelo estado de pânico, podendo durar vários minutos e em casos severos podem variar de 1 a várias horas, dependendo do tempo que dure o estímulo (barulho provocado por fogos durante a Copa do Mundo).
Para minimizar este sofrimento, indicamos abaixo a receita de florais da terapeuta Martha Follain:
FLORAIS DE BACH
ATENÇÃO: Quando for mandar manipular a fórmula Floral, lembre de avisar que a mesma não poderá conter CONSERVANTES, portanto, O ÁLCOOL, A GLICERINA E O VINAGRE DE MAÇÃ estarão FORA! Nesta fórmula, somente poderá entrar ÁGUA MINERAL, e, embora, nas farmácias de manipulação costumem dizer que esta fórmula só dura dois dias, NA GELADEIRA, ela durará QUINZE DIAS, com certeza! Mande fazer, em qualquer farmácia de manipulação (aquela que avia receitas):
RESCUE + CHERRY PLUM + ROCK ROSE + MIMULUS + VERVAIN + SWEET CHESTNUT
DOSAGEM
Para aves pequenas: 2 gotas da fórmula, 4 vezes ao dia, pode ser colocada no bebedouro;
Para aves médias: 4 gotas da fórmula, 4 vezes ao dia, pode ser colocada no bebedouro;
Para cães de pequeno e médio porte e gatos: 4 gotas da fórmula, 4 vezes ao dia, diretamente na boquinha;
Para cães de grande porte e gigantes: 6 gotas, 4 vezes ao dia, diretamente na boquinha de seu amigão;
Para cavalos ou animais de grande porte: 10 gotas, 4 vezes ao dia, para cada litro.
Para se ter absoluto sucesso no tratamento, é interessante que se tenha continuidade no mesmo, não esquecendo de ministrar as gotinhas regularmente. Aconselha-se a começar o tratamento, pelo menos, 5 dias antes do natal e estendê-lo até o dia 3 de janeiro, já que algumas pessoas insistem em prolongar a barulheira!
IDENTIFIQUE OS ANIMAIS SOB SUA GUARDA
Vamos estimular o uso constante e obrigatório de qualquer tipo de IDENTIFICAÇÃO ANIMAL:
O responsável pelo animal deve fazer uma plaqueta, colocar um pedaço de esparadrapo, escrever na coleira bem forte, o nome do animal e telefone para contato em caso de fuga inesperada!
Isso facilitará a localização do animal!
A quantidade de anúncios de animais desaparecidos é enorme e cada vez maior, todos sem identificação!
A Copa do Mundo está próxima, os fogos de artifício, rojões, etc, assustarão muitos animais!
A fuga pode acontecer por muitos motivos: um descuido no portão, trovões, fêmeas no cio (quando o animal não está castrado!), maus-tratos, etc.
Daí a importância de todos os animais de estimação, usarem mesmo em casa, sempre, identificação fixada na coleira!!
http://www.olharanimal.net/index.php?option=com_content&view=article&id=27&Itemid=37
Propomo-nos a conscientizar o maior número possível de pessoas sobre os danos que causamos aos animais ao usar pirotecnia, para que durante a Copa do Mundo eles não sofram. Nas festas de fim de ano vimos as consequências da infeliz pirotecnia: cachorros perdidos, atropelados, aturdidos e agonizando longe de seus guardiães - que nunca mais encontrarão.
Quando você pratica a pirotecnia, cachorros, gatos, cavalos sentem: palpitações, taquicardia, salivação, tremores, sensação de insuficiência respiratória, falta de ar, náuseas, atordoamento, sensação de irrealidade, perda de controle, medo de morrer.
Essas alterações provocam na conduta do animal tentativas descontroladas de escapar, incentivada pelo estado de pânico, podendo durar vários minutos e em casos severos podem variar de 1 a várias horas, dependendo do tempo que dure o estímulo (barulho provocado por fogos durante a Copa do Mundo).
Para minimizar este sofrimento, indicamos abaixo a receita de florais da terapeuta Martha Follain:
FLORAIS DE BACH
ATENÇÃO: Quando for mandar manipular a fórmula Floral, lembre de avisar que a mesma não poderá conter CONSERVANTES, portanto, O ÁLCOOL, A GLICERINA E O VINAGRE DE MAÇÃ estarão FORA! Nesta fórmula, somente poderá entrar ÁGUA MINERAL, e, embora, nas farmácias de manipulação costumem dizer que esta fórmula só dura dois dias, NA GELADEIRA, ela durará QUINZE DIAS, com certeza! Mande fazer, em qualquer farmácia de manipulação (aquela que avia receitas):
RESCUE + CHERRY PLUM + ROCK ROSE + MIMULUS + VERVAIN + SWEET CHESTNUT
DOSAGEM
Para aves pequenas: 2 gotas da fórmula, 4 vezes ao dia, pode ser colocada no bebedouro;
Para aves médias: 4 gotas da fórmula, 4 vezes ao dia, pode ser colocada no bebedouro;
Para cães de pequeno e médio porte e gatos: 4 gotas da fórmula, 4 vezes ao dia, diretamente na boquinha;
Para cães de grande porte e gigantes: 6 gotas, 4 vezes ao dia, diretamente na boquinha de seu amigão;
Para cavalos ou animais de grande porte: 10 gotas, 4 vezes ao dia, para cada litro.
Para se ter absoluto sucesso no tratamento, é interessante que se tenha continuidade no mesmo, não esquecendo de ministrar as gotinhas regularmente. Aconselha-se a começar o tratamento, pelo menos, 5 dias antes do natal e estendê-lo até o dia 3 de janeiro, já que algumas pessoas insistem em prolongar a barulheira!
IDENTIFIQUE OS ANIMAIS SOB SUA GUARDA
Vamos estimular o uso constante e obrigatório de qualquer tipo de IDENTIFICAÇÃO ANIMAL:
O responsável pelo animal deve fazer uma plaqueta, colocar um pedaço de esparadrapo, escrever na coleira bem forte, o nome do animal e telefone para contato em caso de fuga inesperada!
Isso facilitará a localização do animal!
A quantidade de anúncios de animais desaparecidos é enorme e cada vez maior, todos sem identificação!
A Copa do Mundo está próxima, os fogos de artifício, rojões, etc, assustarão muitos animais!
A fuga pode acontecer por muitos motivos: um descuido no portão, trovões, fêmeas no cio (quando o animal não está castrado!), maus-tratos, etc.
Daí a importância de todos os animais de estimação, usarem mesmo em casa, sempre, identificação fixada na coleira!!
http://www.olharanimal.net/index.php?option=com_content&view=article&id=27&Itemid=37
sexta-feira, 4 de junho de 2010
Ética, dietas e conceitos
Ética, dietas e conceitos
Sônia T. Felipe
Vegetusiano, vegetariano ou vegano? Qual a diferença? Se perguntarmos a qualquer pessoa na rua o que lembra a palavra “vegetariano”, a maioria vai responder que essa palavra designa uma pessoa que não come nada de animais. Se perguntarmos o que quer dizer “vegano”, poucas são as pessoas que conhecem o termo. E raras são as que conhecem a distorção deliberada que os “vegetarianos tradicionais” fizeram do conceito por detrás do termo. Ouvimos dos “vegetarianos” que ingerem laticínios, ovos, mel e qualquer derivado de secreções glandulares de fêmeas de outras espécies, que a palavra deriva do latim, vegetus, cujo significado é vigoroso.
Se fosse verdade que a palavra inglesa vegetarian derivasse do latim, conforme querem os “ovo-lacto-api-vegetarianos” conservadores, a palavra não poderia ter sido escrita desse modo, deveria ser: vegetusian. Em português deveria ser, então, vegetusiano. Leite e ovos não dão em árvores, nem são extraídos do solo. São extraídos do corpo de fêmeas de outras espécies.
Se os vegetarianos conservadores de fato estivessem a nomear sua escolha com base no conceito latino, derivado da palavra vegetus, deveriam dizer-se vegetusianos, deixando a palavra vegetariano, que foi sequestrada por eles para designar falsamente sua dieta, repleta de produtos de origem animal. Que pena! Poderíamos agora ter mais transparência ética na designação do tipo de dieta adotada pelos ovo-lacto-api-vegetarianos.
Os que não adotam uma dieta pensando apenas em se tornar vigorosos, e sim em erradicar de seu prato qualquer comida que resulte da exploração de animais, teriam então o termo correto para se autodesignar: vegetarianos, isto é, os que comem exclusivamente alimentos de origem vegetal.
Quando os vegetusianos usam a palavra vegetariano para designar seu “estilo” alimentar, cometem um erro. Fazem passar sua escolha pelo que de fato ela não é. Vegetarianos deveriam ser somente os que se alimentam exclusivamente de produtos de origem vegetal. Vegetusianos deveriam ser aqueles que adotam uma dieta com o intuito de se tornarem fortes, vigorosos. Para os vegetusianos a questão do sofrimento e morte dos animais é menos relevante. A maioria deles até topa participar de debates em defesa dos animais, mas seu propósito é divulgar o vegetusianismo, ainda que usando a palavra vegetarianismo. Isso confunde as pessoas.
O fundador da primeira sociedade britânica vegana, Donald Watson, denunciou em 1944 o engodo dos vegetarianos que passavam ao público a ideia de que a palavra vegetarian derivaria do latim vegetus. Segundo Watson, os “vegetarianos” assim procedem porque não conseguem explicar para as pessoas o uso do termo vegetariano para designar sua dieta, quando ela contém ovo, leite, mel e derivados destes.
Para não ter de explicar que eram vegetarianos só numa parte do conteúdo de seu prato, os conservadores inventaram essa história de que o termo vegetariano deriva do latim vegetus. Cometem um erro grosseiro, pois basta olhar o termo vegetus para ver que dali não dá para derivar vegetariano e sim vegetusiano. Uma acrobacia tem de ser feita com as letras, para escrever vegetariano como se derivasse de vegetus. Essa acrobacia devemos aos conservadores ovo-lacto-api-vegetusianos.
Uma lástima. Por sorte, após anos de insatisfação por ter de explicar para as pessoas que era vegetariano estrito, autêntico, que só comia coisas do reino vegetal, que não ingeria laticínios, nem ovos, nem mel, Donald Watson, juntamente com Elsie Shrigley e outros cinco vegetarianos estritos, fundaram a primeira sociedade vegana na Inglaterra [cf. Joanne Stepaniak, The Vegan Sourcebook]. Desde então temos esses dois termos, vegetariano e vegano, para distinguir quem come coisas de origem animal e quem não as come.
Para além da alimentação, veganos têm uma díaita, do grego, “modo de vida”, que escolhe a abstenção de todo e qualquer produto de origem animal, não apenas na hora de comer, mas também na hora da higiene pessoal, da limpeza da casa, dos acessórios de moda, dos cosméticos, dos medicamentos. Obviamente, viver um projeto de vida vegana em meio à ditadura da propriedade, exploração e extermínio de animais não é algo que possa ser concretizado de forma pura. Por isso, para ser vegano é preciso, além da honestidade com o uso do termo quando explica a outras pessoas o que a distingue das demais em seu modo de vida, muita determinação e lucidez, para desfazer, uma a uma, as pregas, dobras, rugas e os vincos da moralidade tradicional traiçoeira, ardilosa, que nos enredou nessa forma de vida que representa puro tormento para os animais.
Veganos são vegetarianos no sentido autêntico do termo. “Vegetarianos tradicionais” são vegetusianos. Sua preocupação não é com o sofrimento e morte dos animais, é apenas com seu próprio vigor. E aí, mais uma vez, erram. Ingerir laticínios é a fonte da maior parte das doenças degenerativas e crônicas do nosso tempo. Seria bom antenar-se para o sentido original do termo vegetus, que tanto dizem seguir: buscar o vigor. Ingerindo laticínios não estão apenas a torturar fêmeas bovinas, estão a produzir em seus organismos muitos males.
[cf. Frank A. Oski, Don’t Drink Your Milk!; Neal Barnard, Breaking the Food Seduction; e Foods That Fight Pain; John A. McDougall, Digestive Tune-up; Caldwell B. Esselstyn, Prevent and Reverse Heart Disease; Jane A. Plant, The No-Dairy Breast Cancer Prevention Program; T. Colin Campbell e Thomas M. Campbel II, The China Study; Keith Woodford, Devil in The Milk; Robert Cohen, Milk–the Deadly Poison].
A única saída para a saúde e vigor, sem violência contra fêmeas de outras espécies, é a díaita vegana. Abandonem a inocência, vegetusianos!
Fonte: Anda - http://www.anda.jor.br/?p=25016
Se fosse verdade que a palavra inglesa vegetarian derivasse do latim, conforme querem os “ovo-lacto-api-
Se os vegetarianos conservadores de fato estivessem a nomear sua escolha com base no conceito latino, derivado da palavra vegetus, deveriam dizer-se vegetusianos, deixando a palavra vegetariano, que foi sequestrada por eles para designar falsamente sua dieta, repleta de produtos de origem animal. Que pena! Poderíamos agora ter mais transparência ética na designação do tipo de dieta adotada pelos ovo-lacto-api-
Os que não adotam uma dieta pensando apenas em se tornar vigorosos, e sim em erradicar de seu prato qualquer comida que resulte da exploração de animais, teriam então o termo correto para se autodesignar: vegetarianos, isto é, os que comem exclusivamente alimentos de origem vegetal.
Quando os vegetusianos usam a palavra vegetariano para designar seu “estilo” alimentar, cometem um erro. Fazem passar sua escolha pelo que de fato ela não é. Vegetarianos deveriam ser somente os que se alimentam exclusivamente de produtos de origem vegetal. Vegetusianos deveriam ser aqueles que adotam uma dieta com o intuito de se tornarem fortes, vigorosos. Para os vegetusianos a questão do sofrimento e morte dos animais é menos relevante. A maioria deles até topa participar de debates em defesa dos animais, mas seu propósito é divulgar o vegetusianismo, ainda que usando a palavra vegetarianismo. Isso confunde as pessoas.
O fundador da primeira sociedade britânica vegana, Donald Watson, denunciou em 1944 o engodo dos vegetarianos que passavam ao público a ideia de que a palavra vegetarian derivaria do latim vegetus. Segundo Watson, os “vegetarianos” assim procedem porque não conseguem explicar para as pessoas o uso do termo vegetariano para designar sua dieta, quando ela contém ovo, leite, mel e derivados destes.
Para não ter de explicar que eram vegetarianos só numa parte do conteúdo de seu prato, os conservadores inventaram essa história de que o termo vegetariano deriva do latim vegetus. Cometem um erro grosseiro, pois basta olhar o termo vegetus para ver que dali não dá para derivar vegetariano e sim vegetusiano. Uma acrobacia tem de ser feita com as letras, para escrever vegetariano como se derivasse de vegetus. Essa acrobacia devemos aos conservadores ovo-lacto-api-
Uma lástima. Por sorte, após anos de insatisfação por ter de explicar para as pessoas que era vegetariano estrito, autêntico, que só comia coisas do reino vegetal, que não ingeria laticínios, nem ovos, nem mel, Donald Watson, juntamente com Elsie Shrigley e outros cinco vegetarianos estritos, fundaram a primeira sociedade vegana na Inglaterra [cf. Joanne Stepaniak, The Vegan Sourcebook]. Desde então temos esses dois termos, vegetariano e vegano, para distinguir quem come coisas de origem animal e quem não as come.
Para além da alimentação, veganos têm uma díaita, do grego, “modo de vida”, que escolhe a abstenção de todo e qualquer produto de origem animal, não apenas na hora de comer, mas também na hora da higiene pessoal, da limpeza da casa, dos acessórios de moda, dos cosméticos, dos medicamentos. Obviamente, viver um projeto de vida vegana em meio à ditadura da propriedade, exploração e extermínio de animais não é algo que possa ser concretizado de forma pura. Por isso, para ser vegano é preciso, além da honestidade com o uso do termo quando explica a outras pessoas o que a distingue das demais em seu modo de vida, muita determinação e lucidez, para desfazer, uma a uma, as pregas, dobras, rugas e os vincos da moralidade tradicional traiçoeira, ardilosa, que nos enredou nessa forma de vida que representa puro tormento para os animais.
Veganos são vegetarianos no sentido autêntico do termo. “Vegetarianos tradicionais” são vegetusianos. Sua preocupação não é com o sofrimento e morte dos animais, é apenas com seu próprio vigor. E aí, mais uma vez, erram. Ingerir laticínios é a fonte da maior parte das doenças degenerativas e crônicas do nosso tempo. Seria bom antenar-se para o sentido original do termo vegetus, que tanto dizem seguir: buscar o vigor. Ingerindo laticínios não estão apenas a torturar fêmeas bovinas, estão a produzir em seus organismos muitos males.
[cf. Frank A. Oski, Don’t Drink Your Milk!; Neal Barnard, Breaking the Food Seduction; e Foods That Fight Pain; John A. McDougall, Digestive Tune-up; Caldwell B. Esselstyn, Prevent and Reverse Heart Disease; Jane A. Plant, The No-Dairy Breast Cancer Prevention Program; T. Colin Campbell e Thomas M. Campbel II, The China Study; Keith Woodford, Devil in The Milk; Robert Cohen, Milk–the Deadly Poison].
A única saída para a saúde e vigor, sem violência contra fêmeas de outras espécies, é a díaita vegana. Abandonem a inocência, vegetusianos!
Fonte: Anda - http://www.anda.
Animais, religião e ciência
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O respeitável público não quer mais animais em circos!
30/05/2010 |
O respeitável público não quer mais animais em circos! |
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Renata de Freitas Martins - renata@conjectura. | ||||||
INTRODUÇÃO Atualmente estamos vivenciando um importantíssimo momento ético e legislativo em relação à presença de animais em espetáculos circenses. Muitos os Estados e Municípios que atentaram para a questão, especialmente pelo crescente pleito da sociedade pelo fim da crueldade que a subsunção dos animais não-humanos aos animais humanos em circo significa. Atualmente são cinco os Estados que proíbem as apresentações, bem como mais de cinqüenta Municípios em todo o país. Há ainda em tramitação projetos de leis em muitas cidades, alguns Estados, com destaque para a Bahia (PL 16.957/07, de autoria do deputado estadual Javier Alfaya) e também um de âmbito Federal, o PL 7291/06, tramitando atualmente na Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados. A aprovação dos citados projetos de lei é de suma importância, conforme pode-se depreender dos argumentos que apresentaremos a seguir. ORIGENS DA UTILIZAÇÃO DE ANIMAIS EM CIRCOS Segundo Antônio Torres, em seu História do circo no Brasil (Funarte, 1998), é possível que a arte circense tenha suas raízes na Grécia antiga e no Egito. Os espetáculos desse período tinham a forma de procissões, cujo objetivo era celebrar a volta da guerra. Nesses cortejos, desfilavam homens fortes conduzindo os vencidos, trazidos como escravos, e animais exóticos, utilizados para demonstrar quão longe foram os generais vencedores. Há, ainda, registros da presença da arte circense na China, onde a acrobacia era bastante popular, datados de mais de 4 mil anos. Relatos dão conta de que os chineses organizavam um festival anual desse tipo de apresentação. Dele teriam se originado os números da corda bamba e do equilíbrio sobre as mãos. Espetáculos semelhantes ganharam força no Império Romano com a apresentação de habilidades incomuns em grandes anfiteatros, como o Circo Máximo de Roma e, mais tarde, o Coliseu, que comportava quase cem mil espectadores. Fazia parte da diversão, além da exibição de habilidades, a exposição do raro, do excêntrico, do inusitado - como animais exóticos, homens louros nórdicos, engolidores de fogo, gladiadores, entre outras atrações. No período de perseguição ao cristianismo, as arenas foram ocupadas por espetáculos de violência, como a sangrenta entrega de cristãos a felinos. Com o passar do tempo, o impulso por divertir foi tomando novas formas e ocupando diferentes espaços. Durante séculos, artistas se exibiram em feiras populares, praças públicas e entradas de igrejas, com truques mágicos, malabarismo e outras habilidades julgadas incomuns. O circo moderno, na forma como conhecemos hoje, com espetáculos pagos, picadeiro, cobertura de lona e cercado de arquibancadas, é invenção mais recente. Foi criado em 1770, por Philip Astley, suboficial inglês que comandava apresentações da cavalaria. Em seu circo, além das atrações com cavalos, Astley incluiu saltimbancos e palhaços. O enorme sucesso do espetáculo em Londres inspirou a criação de apresentações semelhante em toda a Europa e para além dos limites do Velho Mundo. Nos Estados Unidos, primeiro país das Américas a receber essa atração, o circo consolidou sua característica itinerante, ao viajar por distintas cidades para fazer apresentações. Também nos Estado Unidos, o espetáculo consagrou a apresentação do que se consideravam excentricidades - mulheres barbadas, anões, gigantes, gêmeos siameses, pessoas muito velhas e deformações humanas e animais. No Brasil, há registro da existência de pequenos espetáculos circenses a partir do final do século XVIII, provavelmente trazidos por ciganos expulsos da Europa. Em suas apresentações, esses artistas utilizavam doma de animais, números de ilusionismo e até teatro de bonecos. O circo moderno, no entanto, só chegou ao país no século XIX. Incentivadas pelos ciclos econômicos do café, da borracha e da cana-de-açúcar, grandes companhias européias vieram apresentar-se nas cidades brasileiras. Foram essas companhias que ajudaram a formar as primeiras famílias de circo, responsáveis pelo progresso da arte circense no Brasil. O desenvolvimento do circo brasileiro não se deu em termos de espaços e equipamentos - concentrou-se no elemento humano, na sua destreza e habilidade. Foram mantidos números clássicos, como o do engolidor de fogo ou o da corda bamba, e criadas novas atrações adaptadas à cultura local. Os nossos palhaços, por exemplo, sempre falaram muito e usaram um tipo de humor mais malicioso, diferentemente do palhaço europeu, que era, por tradição, um mímico. Os números perigosos como o trapézio ou a doma de animais também ganharam mais espaço por de certa forma agradar muito aos brasileiros, à época desprovidos de informações sobre doma, manutenção dos animais nos circos e afins. O circo que conhecemos é, portanto, fruto da evolução da arte circense. Esse espetáculo tradicional, familiar, composto de palhaços, trapezistas, mágicos e domadores, que povoou a infância de muitos e ocupa espaço na memória nacional, passa, no presente, por novas mudanças, seguindo o seu curso de evolução. O surgimento dos grandes centros urbanos, o desenvolvimento tecnológico, o crescimento da economia da cultura, a concorrência de novas formas de entretenimento levaram os espetáculos circenses a se profissionalizar e a se concentrar na performance dos artistas. Nesse novo cenário, o conhecimento circense não se transmite somente de pai para filho - exige preparo em escolas especializadas. Hoje são poucos os circos que continuam familiares. Muitos donos de empreendimentos circenses que atuaram nos picadeiros preferem zelar para que seus filhos estudem e permaneçam no circo não como artistas, mas como administradores. A mudança nos valores e no perfil da nossa sociedade, cada vez mais urbana, tem criado uma demanda mais sofisticada e mais cosmopolita para a arte. Para adaptar-se aos novos tempos, os circos já vêm incorporando tentativas de desenvolver um diferente tipo de espetáculo que envolva novas linguagens além das atrações tradicionais. O circo contemporâneo - ou novo circo, como alguns historiadores o chamam - apresenta um modelo que prospera atualmente, conhecido como circo do homem, por envolver somente a figura humana nas performances, excluindo a participação de animais. Seu formato, ainda em processo de desenvolvimento, representa uma tentativa de adaptar as artes circenses às exigências do mercado artístico contemporâneo, de fazê-lo acessível a todos os públicos, respeitando os valores sociais, sem deixar de cumprir os objetivos primordiais do circo: proporcionar alegria, ilusão e fantasia, em favor do entretenimento. Vários circos internacionais, como o Cirque du Soleil, do Canadá, e o Circo Oz , da Austrália, adotam essa nova abordagem artística, que não admite o uso de animais, cedendo espaço para as performances humanas. No Brasil, muitos circos orientam-se por essa concepção, como o Circo Popular do Brasil, a Intrépida Trupe, os Irmãos Brothers, o Circo Roda Brasil, o Teatro de Anônimos, entre tantos outros. Esse novo modelo tem contribuído para a valorização do artista circense, criando um mercado promissor e altamente competitivo para esse profissional, com a remuneração associada à sua habilidade e ao grau de dificuldade da exibição. MANUTENÇÃO E TREINAMENTOS DE ANIMAIS EM CIRCOS: GENERALIDADES É sabido que os animais não humanos são dotados de sentimentos e instintos. Assim, como os animais ditos racionais, sentem dor, medo, angústia, stress, prazer, desprazer, tristeza, etc. São seres sencientes e que devem ter a mesma consideração à vida que qualquer outro ser vivo, pois estão todos em um mesmo patamar moral. Nos circos, para que o animal se apresente manso e obediente, cada espécie é treinada de uma determinada forma a seguir explicitada: ELEFANTES "Como fazer para conseguir a atenção de um elefante de 5 toneladas. Surre-o. Eis como." (Saul Kitchener - diretor do San Francisco Zoological Gardens)
LEÕES, TIGRES E OUTRO FELINOS
URSOS
MACACOS
CAVALOS
TODOS OS ANIMAIS EM CIRCO
Com efeito, os animais obedecem não por índole, mas porque sentem dor, desespero, medo, raiva, aflição, insatisfação, incômodo, situações que, sem dúvidas são caracterizadas como crueldade e maus-tratos. DOMESTICAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES? Animais silvestres ou selvagens são aqueles naturais de determinado país ou região, que vivem junto à natureza e dos meios que este lhes faculta, pelo que independem do homem. Pois bem. Com esta definição de animais silvestres fica latente que a domesticação destes é algo totalmente anti-natural, e, portanto, é considerada maus tratos, já que para que esta existe, haverá que se retirar o animal de seu habitat natural, alterando-lhe toda uma estrutura de vida e costumes, podendo inclusive levar-lhes à morte. Aliás, não apenas a retirada do animal de seu habitat que lhe trará malefícios, mas também, e, principalmente, os hábitos que o ser humano irá imputar-lhe, para que viva com essa nova "sociedade", portanto, mesmo que sejam originários da vida em cativeiro, as condições de vida que lhes são imputadas nada têm a ver com as necessidades que têm. Em circos, normalmente os hábitos novos imputados aos animais são dos mais cruéis. Animais são forçados a realizar malabarismos e diversos outros números para entreter o público, porém, para que "aprendam" a fazer tudo que seus domadores desejam, sofrem demais. Devemos finalmente ressaltar que, animais silvestres, apesar de em tese terem sido domesticados, podem revoltar-se, e então, ninguém será capaz de pará-los. Temos exemplos recentes de acontecimentos fatais por causa desta insistência de alguns circos em manterem animais em seus números, como a morte do garoto Juninho em Pernambuco, que fora puxado para dentro da jaula de leões famintos e lhes servindo de refeição, após três dias de total jejum. Assim, é inquestionável que lugar de animal silvestre é na natureza, seu habitat natural, e que a diversão humana, sadia e inteligente, imprescinde do sofrimento de outrem, afinal de contas, artistas de circos sem animais são muito criativos, talentosos e capazes de entreter seu público. Nada como o bom e velho palhaço, os malabaristas, trapezistas e mágicos! E OS ANIMAIS DOMÉSTICOS? Também é comum encontrarmos animais domésticos, como cães, gatos e cavalos em apresentações de espetáculos públicos. Mas será que o simples fato de serem domésticos é permissivo para que seus tutores façam o que bem entenderem com eles? Do mesmo modo que os animais silvestres nativos e exóticos, os domésticos indubitavelmente também possuem sua tutela legal e jurídica albergada por nossa legislação em vigor. Ademais, de se ressaltar que animais domésticos são seres especialmente de companhia e não devem ser submetidos a longas jornadas de treinamento e trabalho, sendo obrigados a realizar atividades totalmente contrárias à sua natureza, bem como estando expostos a músicas em altos sons, gritaria e afins (lembrando-se que a audição dos animais é extremamente mais sensível e potente que a dos humanos. O cavalo, por exemplo, possui uma acuidade auricular quatro vezes melhor que a dos humanos). De se ressaltar ainda que um animal só aprende determinado procedimento após repeti-lo incontáveis vezes, por reflexos condicionados, e, portanto, mesmo se tratando de um animal doméstico, não há nada natural em se forçar um cão a ficar constantemente apoiado apenas em duas patas ou então que um gato pule de uma altura de 20 metros ou ainda um cavalo dando pinotes em minúsculos palcos escorregadios, por exemplo. Finalmente, não poderíamos deixar de citar os danos físicos que acometem os animais domésticos, que chegam até mesmo a pagar com suas próprias vidas para realizarem algum número forçado por seus "treinadores" ILEGALIDADE E INCONSTITUCIONALIDA Além de legislação específica já em vigor em determinados locais, conforme já citamos, devemos também atentar que nossa legislação ambiental alberga a tutela dos animais, inclusive todos aqueles utilizados em circos. A Constituição da República, no capítulo do Meio Ambiente, assim dispõe: "Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1° - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade." Importantíssimo ainda a tutela aos animais albergada pelo Decreto Federal 24.645/1934: "Art. 1° - Todos os animais no país são tutelados do Estado. Art. 2°, § 3°: Os animais serão assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público, seus substitutos legais e pelos membros das sociedades protetoras dos animais. Citado decreto, inclusive, já proíbe a apresentação de animais em circos desde o ano de 1934, conforme podemos depreender de seu artigo 3º, que em rol exemplificativo traz situações que tipificam situações de maus tratos, e especialmente em seu inciso XXX, assim considera a exibição de animais em casas de espetáculos para a realização de acrobacias, ou seja, exatamente as atividades praticadas por circos. Já a Lei de Crimes Ambientais (Lei federal n° 9.605/1998), finalmente, contempla o seguinte tipo: "Art. 32 - Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos." Assim, devemos ressaltar que a proteção de todos os animais está albergada em nossa legislação, sendo crime qualquer ato que prejudique o animal, seja ele um cão poodle, um cavalo ou animais exóticos utilizados em apresentações circenses (elefante, urso, camelo). E não obstante a questão legal abordada, a preservação da VIDA, seja ela de qual forma for, há que prevalecer como objetivo primordial e essencial na consciência e ética humana e ambiental. O ser humano deve alcançar a tão necessária evolução e parar definitivamente com a arcaica e irracional exploração de animais, tornando-se finalmente um ser racional, condição da qual tanto se orgulha de ostentar. DOS DISPOSITIVOS DO IBAMA A RESPEITO DE ANIMAIS EXÓTICOS EM CIRCOS Mister também ressaltarmos que, mesmo que se considerasse a possibilidade de manutenção de animais em circos, os animais presentes atualmente em circos de modo algum poderiam estar atualmente sob a tutela dos circenses, tendo em vista que é notório a qualquer leigo a falta de condições adequadas para a dignidade destes animais. Conforme portaria IBAMA n.º 108/94, que regulamenta a manutenção de algumas espécies de animais exóticos por pessoas físicas ou jurídicas, dentre elas, aqueles mais comuns mantidos por circos como o Ursus arctus (urso pardo), o Elephas maximus (elefante asiático), o Panthera leo (leão) e o Panthera tigris (tigre), algumas exigências devem ser atendidas. As principais são: - assistência permanente de pelo menos um médico veterinário; - que o animal seja sexado e marcado (leia-se microchipado) - apresentação de relatório anual (atualmente também com relatórios resumidos trimestrais a serem apresentados via internet); - proibição de visitação pública; - recinto nos mínimos padrões exigidos:
Além das regras citadas, o transporte desses animais apenas poderá ser feito com a obtenção das respectivas guias de transporte (GTA), estando os animais com todas vacinações em dia, bem como com estado de saúde totalmente perfeito. Importante também lembrar que é proibido no país a entrada de espécie exótica sem as devidas autorizações (artigo 31 da Lei de crimes ambientais), e, portanto, mesmo que filhotes tenham nascido no país, necessário comprovar-se a origem dos animais, bem como de todos seus ascedentes, pois a existência de ao menos um único animal que tenha entrado no país de forma ilegal, já enseja a ilegalidade de todos os seus descendentes. Portanto, sem necessidade de conhecimento técnico algum, apenas pela simples observação, é notório que algumas das normas basilares para se tutelar os animais não são observadas minimamente pelo circo, especialmente no que se refere à questão de visitação pública e de padrões mínimos de recintos. ALGUNS FATOS OCORRIDOS EM CIRCOS COM ANIMAIS NO BRASIL São muitos os acidentes com animais em circos, prejudicando os próprios animais, bem como seus tratadores, outros componentes dos circos, o público e a população em geral. Para não nos tornarmos muito prolixos, selecionamos apenas alguns dos fatos para exposição a seguir, apenas a título de mera exemplificação prática: - Bady Bassit/São José do Rio Preto/SP, abril de 2008: leão solto por circo causa pânico na região; - Mata de São João/BA, dezembro de 2007: macaco arranca parte do dedo de uma menina de 3 anos. Animal fica em jaula improvisada em carrinho de supermercado; - Cuiabá/MT, dezembro de 2007: leão pula muro e foge de circo; - Vitória/ES, outubro de 2007: mulher tem braço amputado após mordida de leão de circo que tentou acariciar. - Palhoça/SC, maio de 2006: elefante foge de circo; - Itaboraí/RJ, fevereiro de 2006: leão é encontrado em jaula aberta escorada apenas com uma tábua em frigorífico abandonado; - Uberaba/MG, dezembro de 2005: 5 leões são abandonados por circo m estrada; - Ervália/MG, julho de 2005: macaca chimpanzé arranca dedo mínimo de criança de 12 anos que estava em circo que se apresentava na cidade; - Campos do Jordão/SP, julho de 2005: dois tigres morrem no circo Stankowich. A priori afirmou-se que fora de frio, porém, após, em laudo feito por veterinário do circo, ficou constatada morte por vírus transmitido por gato doméstico, o que no sugere a ingestão de animais domésticos pelos animais do citado circo, já que representantes do circo tentaram descartar o cadáver de um dos animais, abrindo-lhe e queimando as vísceras, inclusive. - Restinga Seca/RS, junho/2005: criança de oito anos sofreu ferimentos ao encostar em grade de leão, o qual acabou sendo executado com choque elétrico, por meio de aparelho para este fim portado por seu treinador; - Lavras do Sul/RS, maio/2005: homem é atacado por um tigre de circo, tendo seu braço esquerdo amputado; - São Paulo/SP, fevereiro de 2005: chimpanzé Dolores, após ter sido retirada do circo Di Napoli pelo IBAMA, estando depressiva e com bronquite crônica, finalmente é encaminhada para um santuário após decisão judicial; - Antônio Carlos, Florianópolis/ - Curitiba/PR, junho de 2004: IBAMA precisa encontrar um novo lar para 2 leões que estavam com um particular e não têm mais condições de mantê-los. Animais nascidos em circo; - Iguaraci/PE, abril de 2004: o urso pardo Bruno, maltratado e desnutrido é simplesmente abandonado por circo no sertão do Pernambuco; - Penha/SC, março de 2004: morre gato em conseqüência de queda na apresentação do número "pulo do gato" em circo em Santa Catarina; - Aparecida de Goiânia/GO, dezembro de 2003: tigresa da espécie real de bengala ataca tratador, mordendo antebraço e bíceps do rapaz, o qual teve sérios ferimentos, tendo que ser submetido a cirurgia para tentar recuperar os movimentos; - São Paulo/SP: Bambi, elefanta presente no circo Stankowich escapa para a Radial Leste em pleno horário de rush; - Penha/SC, outubro de 2003: morre Madú, elefanta que viveu anos em um circo e passou o final de sua vida em um outro circo em Santa Catarina. No laudo atestava-se que a elefanta morreu com um raio na cabeça, apesar de ter vivido ao redor de uma cerca eletrificada e de diversas testemunhas terem presenciado sua cruel morte por eletrocussão; - Sumaré/SP, janeiro de 2003: circo Stankowich abandona três leões no centro da cidade de Sumaré/SP, alegando não querê-los mais. Os animais foram encaminhados em estado lastimável de saúde para o Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, sendo que um dos animais estava tão debilitado, que veio a óbito; - Maracanaú/CE, dezembro de 2001: leoa morta a tiros depois de escapar em circo no Ceará; - Curitiba/PR, agosto de 2001: trapezista do circo imperial do México teve que amputar braço após ter sido atacado por leoa; - Atibaia/SP, abril de 2000: circo Bartholo abandona 3 leões e 1 leoa em terreno baldio; - Recife/PE, abril de 2000: leões matam garoto. Quatro leões famintos do circo Vostok puxam o garoto Juninho para dentro da jaula no intervalo da apresentação do espetáculo circense. Garoto tem uma morte trágica e cruel e os animais são todos mortos. Em exame necroscópico, há a constatação de que os animais não comiam há dias. CONCLUSÕES Os legisladores baianos, bem como os federais deverão atentar-se que o circo contemporâneo apresenta um modelo que prospera atualmente, conhecido como circo do homem, por envolver somente a figura humana nas performances, excluindo a participação de animais. Além disso, a utilização de animais não humanos para tentativa de atraçãode um suposto público é uma ultrapassada e falidaestraté Também não há que se falar em educação, arte e cultura na apresentação de animais em situações totalmente estranhas às suas naturezas, além de toda uma vida submetida às jaulas e à itinerância, sob todo tipo de intempérie climática. Educação, arte e cultura não são feitas e nunca o serão por meio da exploração de qualquer forma de vida que seja, pois caso contrário teríamos um enorme contra-senso. Qual seria a lição a se transmitir a uma criança ao fazê-la ver um elefante subindo em um banquinho? Ou um leão e um tigre pulando um arco de fogo? Ou ainda um urso dançando ou andando de bicicleta? Um gato pulando de uma altura de dez metros e se espatifando no chão? Não vejo outra a não ser a de que animais seriam seres inferiores e que o humano ("todo-poderoso" Assim, roga-se que legisladores tenham uma atuação ética e não antropocêntrica, coadunando-se com as tendências mundiais morais globais, e finalmente votando e aprovando o PL do Estado da Bahia 16.957/07 e o PL federal 7291/06, proibindo-se a apresentação e manutenção de quaisquer animais não-humanos nos circos e espetáculos assemelhados. E que o respeitável público ostente mesmo esse título de respeitável e continue evoluindo em seus conceitos éticos, morais e legais, não aceitando a crueldade como cultura e arte. |
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